8.4.08

Fazer como fazem as senhorinhas

Quando eu era um garoto ouvia Legião até sem querer ouvir. Lembro que me assustava quando ouvia “...ela se jogou da janela do quinta do andar...”, era incompreensível para mim, ainda criança, que alguém pudesse se jogar de tal altura. Anos mais tarde um colega de colégio seguiu os mesmos passos criados por Renato Russo em sua letra. Aquilo tudo soava absurdo demais pra mim. É claro que eu imaginava a vida de todos como a que eu tinha, e minha era muito boa graças ao esforço dos meus pais. E mesmo anos mais tarde, compreendendo a diferença de realidades, o vácuo ou o abismo que existem entre as pessoas, não consegui encontrar justificativas convincentes para esses episódios voluntários.
Não me dei conta, mas a violência, não sei se por ser mais noticiada, invadiu minha vida ao ponto de me fazer pensar 3 vezes antes de sair de casa. Agora foi do sexto andar, e alguém a jogou. Apenas uma garotinha prestes a completar seis anos. Dizem que foi o pai com ajuda da madrasta, outros dizem que foi um “ladrão” que nada levou a não ser a vida da pequena Isabella. É quando acho que não ouvirei nada mais absurdo, como assaltantes que arrastam crianças por quilômetros nas esquinas do Rio, ou filhos que são abandonadas na beira de estradas, pra não dizer dentro de sacos plásticos em lagos como o caso da Pampulha, e me dou conta de como o mundo se estragou, de como os vilões estão próximos e que as vitimas, vulneráveis, são nossas sementes, o futuro.
Tudo isso provoca em mim um sentimento de recolhimento. Sim, se eu tivesse uma carapaça, uma concha, eu viveria trancado dentro dela, levando para dentro o necessário básico para sobreviver. O desejo muitas vezes é de descomplicar a vida. Trocar as saídas de fim de semana, divertidas, mas muitas vezes arriscadas demais. Nunca se sabe como será o voltar. A vontade é me entregar à entrega dos meus pais, que anseiam em largar tudo para aproveitar dias tranqüilos numa chácara, plantando folhosas, cuidando de galinhas e se divertindo com o Paco e a Lara.
Esse desejo me toma sobretudo agora que tenho um amor. Posso entender um pouco mais os meus pais (entendam pais como os pais de antigamente, que se sacrificavam pelos filhos e que não os sacrificavam em troca do nada). Hoje, amando, temo pelo meu amor. Descubro dia-a-dia que amar é se preocupar, zelar, é ter a dor de outra pessoa como a sua. E diante da impotência que os noticiários me presenteiam, diante dos absurdos que proliferam sem que ao menos possamos descobrir os verdadeiros culpados, eu vou convivendo entre o viver e o viver menos. Me limitando, calculando passos, fechando vidros, olhos atentos a movimentos estranhos. Para viver é preciso perder um pouco o prazer de viver.
Já que não posso me recolher como desejaria, me apego aos apelos das senhorinhas e entrego a vida nas mãos de Deus. Ele soube me guiar até hoje e isso não vai mudar.

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