7.6.06

Não sei que título colocar ou a volta pra casa.

Sou um prato que caiu e que partiu em muitas partes. Hoje sou isso. Recolho pedaço por pedaço, junto com todo o cuidado do mundo sob os olhares atentos daqueles que me amam. Alguns rezam, outros pedem. Há aqueles que pensam positivo, que desejam, que choram. No fundo querem o mesmo. Querem que não falte um pedaço perdido ao fim desse ritual silencioso e solitário. Temem. Sofrem uma dor sutil com meus gestos lentos já que nada podem fazer. Só eu e tão somente eu posso juntar os meus.
Passo o dia pensando em coisas para escrever e acabo no oposto. O que sinto é sempre mais forte. O momento pede para ser revelado no meu ritmo. Eu já sei que o mundo é bem mais que o que vejo pela janela. O som pode ser mais que silêncio. Pode ser Cat Power cantando I found a reason, não sei o significado, e ainda sim é linda como sorrisos de anjo e como a graça do anjo que me apresentou.
Os dias estão assim, entre sorrisos e lágrimas, entre o peito aberto e a cara virada. Descontrole emocional e aprendo que lidar com as pessoas é mais difícil do que imaginava. Lidar comigo também é fácil tarefa, sobretudo nessas horas de desespero. Creio que não há justificativas para isso, mas cresce a necessidade de entender esse mistério no meu colo. Esse novo filho, nova vida, novo amigo escondido dentro de mim. Por onde queres me levar? O abraço e parece estar tudo bem. Me encho de vida e a vida se encarrega de seguir, mas será assim tão fácil?
Tudo tão nítido e tudo tão escondido. Vivo agora me revirando em opostos próximos. Antes eram rimas mal rimadas, agora são os opostos próximos que fascinam. Coisa doida e ao mesmo tempo cheia de sentidos. As palavras são geralmente as mesmas. Culpa do limitado parque de diversões e ainda assim consigo nessa brincadeira subjetiva falar o novo sem perder o gosto da repetição exagerada. Mas são doces palavras e ainda que repetidas são boas companheiras, com elas realmente sou menos só. Só como deveria.
Queria que fosse uma desilusão amorosa ou uma vaga de emprego que se perdeu como a meses atrás. É mais do que isso e assim a mudança agora é inevitável. Naqueles dias de esquisitos prazeres e falsas mudanças, fui sincero e escrevi:

“Mãe e pai...

Poucas vezes agradeci a vocês por tudo o que fizeram por mim. Escrevi cartas para quase todos e não escrevi para vocês. E se escrever é a forma que encontrei de dizer com mais sinceridade das coisas que sinto, é então o momento de escrever para vocês.
É um dos momentos mais importantes da minha vida e assim da vida de vocês também. Hoje ou amanhã posso receber a noticia que mudará os rumos dos meus dias. Devo a vocês esse momento. Resultado dos anos de estudo, das broncas, dos erros e dos acertos de vocês.
Agora passa aquele filminho. O pai me pegando no colo e dizendo: “amanhã você vai pra escola!” e de você, mãe, dizendo nos momentos mais difíceis, ainda que de boba dificuldade, que tudo sempre acaba bem mergulhado no seu abraço com cheirinho de confort.
Espero ter honrado todo esse esforço. Sei das decepções que causei nos meus tropeços todos. Não ser o filho que vocês esperavam, de não encher a casa de pequeninos que os chamariam de vovô e vovó. Perdoem a minha ignorância quase que constante, falta de paciência, cara feia e conta de telefone alta.
O tempo passou e eu cresci. Tenho saudades do tempo em que era criança e ficava vendo o pai desenhar. Que máximo! Meu pai fazendo desenhos só pra mim! Adorável. E lembro da mãe rindo alto, daquela risada só dela, das noites de verão ao som de Simple Red. Vou levar esses pequenos detalhes para sempre comigo. E já sinto, com dolorosa antecedência, o dia que vocês forem embora. Vou ficar meio só, mas do que sinto nesses dias. Sei que não entendem dessa minha insistência doida de viver em par e encontrar alguém, mas é porque sei que vocês se vão e não quero ficar só. Quem é que vai me abraçar e dizer que ninguém merece minhas lágrimas quando você não estiver aqui, hein pai?
E mãe, eu não falo muito, tentarei com mais freqüência, mas reconheço tudo o que você faz por mim todos os dias. Desculpa algumas grosserias, fico indignado ao ver o quanto você se maltrata, não acha que já tem muita gente fazendo isso por você e com você?
Pode ser que não seja dessa vez, tentei. E se eu ficar mal não se preocupem, vou ficar bem. Mesmo porque aprendi com você, mãe, que tudo sempre acaba bem. E assim, tudo vai ficar bem.
Obrigado por tudo.
Eu amo vocês!
Beijos”

Entreguei a carta. Provoquei algumas lágrimas. A tal mudança não aconteceu. Hoje eu sei que essa carta é guardada por eles como algo muito valioso.
A mudança veio de outra forma. Inesperada, sem cartas. A sensação porém é boa. Voltar para casa sem nunca ter partido. Comecei a reaproximação com essa carta e hoje estou de volta do lugar do qual nunca deveria ter saído.
Assim que colar o último pedacinho, novos sorrisos, novos prazeres, muitas desculpas. Serão dias lindos e inesquecíveis.

4 comentários:

Anônimo disse...

Olha eu aqui outra vez!
Na nossa cabeça e no nosso coração de filhos sempre achamos que não passamos de um grão de areia diante do oceano que são os nossos pais. Mas, não tenha dúvida, de que para eles, vc é e sempre será um grande motivo de orgulho!
Para mim tbm....
bjos
da sua maior fã...

Anônimo disse...

tomadaman,
lembro qdo vc disse q escreveu essa carta pra eles, eu quase chorei.
hj eu li e chorei.
saudades

Anônimo disse...

"... serão dias lindos e inesquecíveis..."
Lindo e inesquecível é vc pra mim.


Uma reaproximação que tende a ser a descoberta de suas vidas.
Vc e seus pais... mto mais do que palavras.


AMO VOCÊ

naturall disse...

eu ainda me lembro do dia em que li essa carta, não conseguia ler por causa das lagrimas sim como vc sabe.
Jú hoje vc é meu melhor amigo, nunca esqueça disso. Demoramos, mas agora somos.

te amo filho.