21.10.06

Até mais, Ibirapuera

- Você está bem?
- Sim, só preciso sair um pouco.
- Você nunca me liga.
- Eu não ligo pra ninguém.
- Do que você está precisando?
- Que idéia errada que tem de mim.
- É o que me faz pensar. Se não liga pra ninguém e resolve me ligar é porque quer alguma coisa.
- Não é verdade. As pessoas mudam.
- Por isso que gostam tanto de você. Por causa da sua incapacidade de mudar.
- Já leu Caio Fernando Abreu?
- Algumas coisas, por que?
- Tem uma frase dele que diz assim: “mudei muito e não preciso que acreditem na minha mudança para que eu tenha mudado”.
- Ok. Você mudou e estou quase convencido disso, o que quer comigo?
- Quero dar uma volta.
- Comigo?
- Sim, com você.
- Jamais pensei que esse dia chegaria, tanto que te chamei para essa voltinha. Tomou algum pontapé na bunda ou algo parecido?
- Você ficou ácido com o tempo.
- As pessoas mudam.
- Estou indo embora para o Rio.
- Você?
- É. As pessoas não só mudam. Elas se mudam ás vezes.
- Quando?
- Agora. No inicio do ano. Então, quer me ver?
- Quero. Onde?
- Ibirapuera. Na Praça do Porquinho. Te espero.

(...)

- Olá!
- Oi.
- Que frio!
- É, tá muito frio.
- Vai sentir falta?
- Do frio?
- É.
- Não sei dizer. Acho que sim. Sinto falta das coisas.
- Sente falta de mim?
- Sim, e você?
- Sabe que sim.
- Agora eu sei apenas o que as pessoas me dizem. Prefiro não adivinhar o que elas pensam.
- Mas você sabe que eu sempre te amei.
- Acho que nem você sabe disso. O que temos é um carinho grande.
- Fale por você.
- Sinto um carinho enorme por você e por isso o chamei aqui. Poderia ter chamado milhares de outras pessoas antes de partir e escolhi você.
- Por que está indo embora?
- Hoje eu sei porque te deixei.
- Por que está indo embora?
- Eu o encontrei.
- Você é maluco.
- Essa é uma das razões. Você não era maluco o suficiente para mim.
- Qualquer um acharia isso bom.
- Não eu.
- Você nunca desistiu, não é?
- Nunca.
- Como sabe que o encontrou?
- Sabendo.
- Eu não fui “ele” um dia?
- Não.
- Então por que ficou comigo.
- Por um instante pensei que não o encontraria. E você era bom o suficiente pra calar a minha busca.
- Você me chamou aqui pra isso?
- Não. Sim. Não. Não sei.
- Eu ainda tentei ficar com você mesmo depois de tudo.
- Por que? Por que queria ou achava que ninguém mais ficaria comigo?
- Porque eu te queria.
- Eu sei e achei lindo o seu gesto, mas não era você.
- O que está tentando fazer? Me libertar?
- Veja como quiser ver.
- Eu já não te amo como amei um dia.
- Eu sei.
- Então não tinha porque me chamar aqui pra contar das suas maluquices.
- Não é o que você está pensando.
- Ir para o Rio de Janeiro atrás de uma pessoa que você sabia que existia e que só não sabia o nome, o sobrenome, se gostava de geléia é maluquice!
- Tanto eu sabia que ele está lá me esperando agora.
- Qualquer um que aparecesse você diria o mesmo.
- Eu disse pra você?
- Não.
- Sinto muito.
- Tudo bem, desculpe.
- Eu precisava lhe dizer. Não posso partir sem antes deixar claro que te deixei porque ele estava me esperando.
- Antes pouco me importava porque você havia me deixado. Você me deixou e nada mudaria. Mas se diz que me deixou para encontrar o seu desconhecido e isso aconteceu, fico feliz por você.
- Obrigado. Você não mudou nada.
- Você também não.
- No nosso caso é bom não mudar, não acha?
- Acho. Prefiro você assim.
- Hoje eu sou quem eu sempre quis ser.
- Dá pra ver nos seus olhos. E São Paulo?
- Amo São Paulo. Paulista, Consolação, Liberdade, vou sentir falta. Mas o meu coração me manda pra lá.
- Sempre admirei pessoas que seguem o seu coração.
- Eu preciso ir. Não posso ficar aqui e pensar o que teria sido se eu tivesse ido. Não faz sentido agora. A minha felicidade está lá, num sorriso lindo, de sotaque mágico, é o que quero.
- Vou sentir a sua falta.
- Eu também.
- Que tal andar de bicicleta?
- Acho ótimo.
- Ei, você o ama?
- Sim, muito, como nunca amei ninguém.
- Então ele é um carioca de sorte.

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