10.1.07

Amor peça de museu ou A Idade de todas as coisas

Posso sentir a idade das coisas. Posso sentir o peso do tempo. Ouvir vozes sobrepostas, de muitas épocas, de inúmeros sotaques, trejeitos, mania no falar. Posso sentir a idade da terra e de todas as coisas que se movem sobre ela. Posso tocar nos mistérios, naqueles segredos engolidos na solidão do universo, dos anos que se passaram sem que nada houvesse. Posso saber o que não sei e tudo o que me fora permitido saber. Como levantar o pano branco que cobre as velhas perguntas. Como todo o movimento calculado para me trazer até aqui nos meios das antigas coisas das quais agora sei a idade e o sofrimento pesado em cada lasca lascada, em cada tinta desbotada, em cada arranhão, marca maldita, pedaço mordido, pedaço arrancado, pedaço faltando. Posso confiar ao meu amor o porquê de todas as coisas existiriam. Posso lhe dar a garantia de ser o motivo de tudo ser, de tudo crer, de tudo estar fora ou não do seu lugar. Tudo foi assim, em anos separados, em lembranças que se engavetavam, outras ornam murais, estampam tristes camisetas de jovem idade. E então, no peso pesado das coisas antigas, no tudo o que sou além do que sou, penso muitas vezes desistir de um amor tão jovem. A noção de tempo passado, de muito tempo passado, se não é que se ter reduzida as passagens de muitas vidas. Como aquele piscar e no outro tudo fora do lugar, mudado, explosão universal de átomos e mais átomos que originaram células, micromundos, microvidas, microcoisas. Micro vírus envenenados de amor, de puro amor, de amor de morte, morte antiga, morte idosa, morte que existe já quando se nasce. Então quando lhe chamo de baby estou apenas lhe dando o prazer de desfrutar da outra ponta da linha do meu tempo. Do ponto de onde não pode sair pois não entenderás do tempo das coisas. Dos anos que se deve passar para não passar desapercebido a um olhar atento. Custa muito ser a si mesmo. Custa muito saber de tudo e agir como nada saber. Custa querer quando sabe-se que não o merece. A morte é amarga por isso. É o apelo avesso, é o grito tardio de vida. O roubo do sopro antigo. É dor da indiferença. Se isolar em datas antigas desperta esse ar melancólico. É a mãe de tetas grandes e ventre inchado da insegurança que se bebe em copos trincados no tempo. E se as coisas antigas de idades muito velhas, se peças envelhecidas, de coisas esquecidas pedem a desistência é por que elas compreendem o peso do tempo. A idade das coisas está nas coisas, na pele descamada sobre pele já maltratada. Está no beijo repetido. No átomo de amor partido. No amor que se parte. No amor jovem que envelhece e que envelhece e que se perde no tempo de todas as coisas.

Nenhum comentário: