19.7.06

O texto vermelho ou quando eu preciso dizer que me amo.

Aprendi a amar ainda muito cedo. Não venha me dizer que é assim com todo mundo. Sei das coisas, sei das coisas de amor. Sei dos caminhos loucos que o amor nos leva. Das voltas todas que se dá por ele, com ele, sem ele, pra ele. Amor e somente amor eterno em todas as condições.
Me busquei longe demais, me perdi e me encontrei. Voltei como os bons soldados que retornam de suas batalhas e mesmo que eu não seja o herói de ninguém, posso dizer que sou o meu herói. Herói é quem nos salva, nos liberta e inspira. E se trouxe vida nova ao meu peito, devo ser o herói de mim.
Não quero medalhas, bustos e nem ruas com meu nome. Não quero casa, carro importado ou aposentadoria gorda. Não quero fúteis prazeres, charutos, cheque em branco ou viagens memoráveis. Não preciso de dinheiro, de ternos bem alinhados, relógios caros ou privilégios.
Igualmente recuso a dó, a piedade, a solidariedade barata e o assistencialismo patético. Recuso os amigos falsos, as lágrimas pedantes, as desculpas inventadas e o perdão fingido. Recuso o interesse cruel por minha dor. Recuso o olhar curioso, o toque receoso, o excesso de zelo, o papo contido a distancia calculada.
Sou o meu herói. Dono de meu tempo e de meus dias. Filho de um padeiro que sonhava em ser palhaço e de uma dona de casa que faz de tudo um pouco e muito bem. Sou abençoado pelos casais de namorados, pelos amores todos, pelos velhinhos doces da minha infância, pela tia boa, pelo olhar calmo.
Quando eu disse que retornaria eu não estava inventando histórias pra preencher o nosso álbum de lembranças amarelas. Eu disse que voltaria pra estar aqui, sorrindo pra você e gritando a minha felicidade mesmo que as portas tenham se fechado. Não importa. Conviver com a dor é a ordem do dia, coisa que se acostuma, que se pode conviver. Assim como o medo, as perdas, os temores. Palavras ruins, pesadas e ainda assim encaradas sempre de forma leve e bem humorada.
A vida inverteu e quando eu me encontrei estava assim, sorrindo com os cotovelos ralados de tanto me procurar rastejando pelo chão que um dia pisou. E se não tem culpa, tão pouco eu a tenho. A culpa não existe desse lado de cá. Aqui há o conformismo dos heróis e o desespero dos que não aceitam as suas batalhas. Nem todo herói sabe que é herói. E seus dias vão ficando curtos como aquele dedinho engraçado que me apontava quando queria paz.
E hoje a paz que dividimos, na loucura que vivo, na solidão que me persegue em dias inertes, é a conquista de algo que sempre sonhei em dias ruins. Há muito de todos nós nessa dor. Há um descaso de mim por mim, mas há esse amor que conheci ainda minúsculo que me levou desesperadamente a me lançar em seios estranhos e arrancar deles a redenção e a dor.
Não posso voltar, a batalha naqueles campos não me pertencem mais. E se não mereço o céu e os brigadeiros, outras batalhas nobres sei que devo enfrentar. Hoje te esperar já não é mais opção. Não é conformismo furado que se compra em hipermercado, é espera de pessoas boas que devem ser pacientemente aguardadas. Então é assim que fico, sentado feliz num banco qualquer de uma estação qualquer te esperando. Hoje é isso. Um sorriso verdadeiro e um momento que não termina.
E a foto do meu herói maior, estampada sem a vergonha que ele tanto gritou é um apelo de como somos cretinos e de como são cretinos com nossos heróis. Como partidos ridículos estão sempre em xeque, nos ferindo e nos estampando em capas de papel sujo. Tem gente que vive do sofrimento alheio, enche a pança dos olhos e chora pela dor “daquele”. Amar demais dá nisso. Vira adoração de circo, coisa exótica, lenda pra contar em noites onde não tiver assunto. É a dor alheia, ainda que seja revista velha. A vida muda, os preços aumentam, a corrupção insiste, os dentes continuam cariados e o homem, pobre homem, é o mesmo imbecil de sempre. Então acho que isso, expor a dor pulsante, assumir quem se é, no exemplo do meu poeta que se foi. A gente nasce amando e esquece de amar pela vida.
Uns nunca esquecem. Meu herói morreu amando. Vou amar também.

Um comentário:

Anônimo disse...

Se vc vai viver amando, eu tb vou... dois é melhor q um... bjo!