17.12.06

Sobre esperas e luzes de Natal

Tenho que me concentrar muito pra imaginar meus dias sem você. Como procurar ampolas com curas nas caixas velhas, nos diários escritos nos quartos vazios repletos de sua ausência. Vem em pesadelos que exageram nessa proteção em preservar o que não pode mais ser protegido. Em pesadelos de não ter você aqui comigo no segundo em que vou deixar tudo para trás. É o brilho dos seus olhos que quero reconhecer no primeiro suspiro dessa nova vida e antes que isso vire uma tragédia, acho que vou continuar me perdendo em pesadelos nos fins das tarde e acordar suado e com marcas de almofadas nas bochechas.
Bem que eu poderia esconder tudo na caixinha, vestir uma camiseta colorida e fazer uma prece de criança. Rir da Dona Sebastiana e da Dona Zefa chamando a irmão irritada de Mariquinha. Uma chateação que tá virando vicio. Um vicia de fazer o tempo passar pra fazer a espera menos dolorida. São ferimentos que não consigo curar, que não há médico para tratar e que penso que apenas no seu doce colo, de palavras que agora compreendo bem, que poderei em fim viver de sorrisos.
Então abro a janela e posso ouvir a briga das vizinhas e me perder nas luzes de Natal. E vou deixando o meu rastro, brincando de João e Maria, pra poder voltar para o coração que me acomoda. Como rir que nem bobo sentado no banco que em outras noites me viu chorar e lamentar pra Lua. Foi como dizer, ainda que esteja esperando, que eu sabia exatamente que viveria tudo aquilo. Voltar ali pra poder provar o improvável. Pra provar o que está estampado no rosto dos meus verdadeiros amigos: eu sou o maluco mais louco e apaixonado desse mundo! Sou aquele que se entregou às suas loucuras que não se cansou, mesmo longe das luzes amarelas, de procurar seus sonhos.
O trem parou para mim e eu quase nem acredito que vão me deixar subir. Estive cansado de esperar aqui fora, agora posso muito bem esperar lá dentro. Não escondo a euforia e não ando economizando nada pra aproveitar cada momento dessa viagem. Logo estarei no trem que sempre passou reto e que me deixou para trás todos esses anos. E quando a hora de partir chegar, quando as luzes de Natal se apagarem, vai ser não mão do amor que vou me segurar. Quando não temos asas, quando temos feridas que não se pode curar, só temos que acreditar na segurança forte de uma mão que nunca vimos, mas que estranhamente sempre soubemos que existia.
Estou esperando e logo estarei partindo.

6.12.06

Depois da esquina... Depois da chuva.

A chuva anunciara que seria assim. Caminham, os dois, dois homens no tempo que não é tempo. Esperam por dias que não são dias, horas que não podem ser contadas, num lugar que não se diz lugar. Apenas caminham na chuva e esperam. Se esperam?

HOMEM 1
Vou morrer?

HOMEM 2
Você não vai morrer.

HOMEM 1
Como sabe?

HOMEM 2
Apenas sei. Não faça mais perguntas, basta a chuva.

HOMEM 1
Eu tenho a sensação que ela está próxima.

HOMEM 2
É apenas uma sensação, nada mais que isso. Você está com medo, aceite e pronto.

HOMEM 1
Como aceitar o mal que trouxeste para mim?

Homem 2 o encara.

HOMEM 2
Disse que nunca me culparia.

HOMEM 1
Como diria se sempre o culpei?

HOMEM 2
A carta...

HOMEM 1
Que carta?

HOMEM 2
A carta em que me perdeu. Escreveu que não me culparia.

HOMEM 1
Não posso...

Homem 2 tira a carta de do bolso e a lê.

HOMEM 2
Não sei se essa carta vai chegar ao destino. Há muito que não tenho noticias suas. Já era raro te ler e agora com esse silêncio todo de palavras e de seus dias, temo por você. De certo modo temo por mim também. Sofro com antecedência permitida de um mal que podes me provocar. Espero não culpá-lo e se isso fizer, guarde essa carta. Onde procurá-lo? Tudo ficou mais escuro que antes. Se o vejo não o reconheço. Se não o reconheço é porque mudou muito ou talvez tenha me esquecido de você. E isso é uma mentira. És vivo em meu olhar e nas histórias que conto. É você que vive, ainda que ausente, nas minhas idas e vindas e tudo tem você sem lhe ter. Estranho assim mesmo. Não sei explicar como posso te viver sem o ter. E o mais estranho é que se foi sem que tenha partido. Não sei chegar em você, tocar, dizer o que deve ser dito. Quando penso que desisti me pego escrevendo sem medidas e mentiras. Escrevo no desespero de um momento sem fim. No desejo de encontrá-lo e arrancar de ti essa coisa que não é tua, esse pesar que não é seu. Hoje sei dos corredores onde se perde, sei dos caminhos tortos, das luzes amarelas, estranhos que te abusam nesses mofos estofados azedos do seu novo lar. Queria poder fazer mais por você e assim faria mais por mim. Falo isso porque iremos nos encontrar um dia e sei que a morte nos rondará, sobretudo quando chover forte e estivermos sós. Quando a chuva chorar a nossa desgraça, dos dias amargos, você levará tudo de mim. E eu não vou te impedir. Nada direi quando arrancar do meu peito a inocência que ainda cedo perdeu. Vou recordar nas suas palavras dessa carta, desse dia, desse mais um dia em que me faltou sem que se quer tenha partido. Agora sei que o perdi e que não posso mais procurá-lo. No momento em que aceitei te perder foi que te perdi. E isso foi nesse instante. Então, se essa carta chegar em vossas mãos, mesmo que as luzes sejam poucas e a esperança ainda te cobre mais suspiros, não sofra por mim, seria inútil, sofreria por antecedência. Também não sofra por você, as palavras belas partirão desse cru lugar. Não se agrida e preserve a essência, só assim nos reconheceremos em tudo aquilo que nos une e nos separa.

HOMEM 1
Lembro dessa carta. Você a guardou.

HOMEM 2
E você desistiu de mim.

HOMEM 1
Desisti de nós.

HOMEM 2
Por que não foi me buscar?

HOMEM 1
Você não deixou.

HOMEM 2
Sempre te esperei! Dia após dia eu esperei você chegar!

HOMEM 1
Você mandou que eu aceitasse os seus sujos e imundos desejos. Que esperasse um dia, nessa chuva, que você me procurasse.

HOMEM 2
Me lembraria desse detalhe ao contrário de você.

HOMEM 1
Isso! Exatamente isso, ao contrário de você! Quer que eu leia a carta que escreveu no escuro?

HOMEM 2
Certamente ela não o inocenta.

Homem 1 tira a carta do bolso e a lê.

HOMEM 1
Ainda que tarde, sempre recebo as suas tristes cartas. Digo tristes pois nada de alegre há mais em você. Sei que há mais consciência em você agora que está na luz que não cega. Sei que de onde estou não o vejo, apenas o idealizo. E sei que seria diferente. Imaginei tantas histórias e nunca pude crer que o veria triste e desacreditado. Então fico na espera sem fim. Porque tenho feito isso, te esperar dia após dia, sem te esquecer nunca. Mas você não vem mais, diz que me perdeu quando na verdade perdeu as cores coloridas de dias alegres e sem fim. Perdeu a vontade de fazer melhor do que somos hoje. Apesar da dor de um certo abandono ser forte e agora constante, não direi nenhuma palavra que não seja uma palavra boa. E se eu o maldizer por não ter vindo me buscar, leia então essa carta. Estaremos juntos, ainda que chova, eu sei que como eu gostas de caminhar na chuva. Leia e esprema o meu passado com crueldade, só assim saberei que fim esses amargos prazeres fizeram conosco. Não sei mais do meu amor. Não sei do que me resta fazer, não consigo imaginar todas elas. Então penso que esse é o meu lugar, aqui sou quem posso ser. Os desejos são bons companheiros e os desejados são um estímulo de dias melhores. E se a pessoa é para o que nasce eu vim ao mundo para isso. Para me entregar sem frescuras a esse prazer que me toma sempre que é noite e estou só. Sim, aqui se está sempre só ainda que alguém esteja ao seu lado. Aqui é frio ainda que abafado. É o meu lugar, sou intimo da falta de bondade e bons sonhos. Aqui não sonhamos, vive-se. E há no mundo melhor lugar que aquele em que podemos viver sem medo? Sem medo do futuro? Do mal que podemos nos fazer quando for tarde para voltar? A inocência ficou naquele carinhoso ninar que não voltam mais. É bom ter desistido, perdido. Não importa mais. Aqui quero ficar e me perder mais e me perder para sempre. Isso há de ser sina e não fará mal nenhum a você. O prazer é meu, o mal só eu poderei carregar. Me deixe aqui e poderei esquecer tudo o que não vivi. Me perca nos meios dos teus papéis, dos teus amigos. Não me faça personagem de histórias mirabolantes. Não me faça de herói. Estou longe de merecer o titulo que é de muitos. Venda a minha natureza, a essência que carreguei. Me leia sem muita atenção, deixe passar desapercebido. Não importa mais. Um dia nos veremos e ainda que chova e ainda sozinhos, teremos um ao outro em dias que não terminam.

Homem 1 encara Homem 2. Eles se abraçam, tão logo são apenas um. O Homem, o mesmo Homem. E abraçado a si mesmo, ele se encolhe. Sozinho. Ele e a chuva.

HOMEM
Não vou morrer.

27.11.06

Marianne

(...)

Quando ele se lembrou de onde viera, daquele lugar desordenado, de pessoas na rua, de ruas imundas, de gritos desesperados, ele ainda assim sentiu falta dos dias incríveis em que Marianne o fazia um verdadeiro herói. A chuva que caia, e da qual ele inutilmente se esquivava era da mesma sutileza, de mesma temperatura, cheiro e gosto do temporal que o abateu na tarde de domingo em que Marianne partiu no comboio amarelo. Não entendeu muito bem na época. Tudo aconteceu como uma mentira repentina. Como aqueles pesadelos que o assaltavam no meio das noites ou como aquelas provocações falsas dos primos mais velhos. Mas o comboio amarelo existiu e no domingo de Páscoa levou Marianne. Alguns acharam que havia sido o melhor pra ela. Lá estaria protegida. Mas ele sabia que quase todos, a grande maioria inúteis egoístas, achavam que assim estariam protegidos de pessoas como a doce Marianne. Os gritos de Dona Dida podiam ser ouvidos ao longe, no passar dos anos. O desespero de Seu Antônio era sua pena de morte. Quando o comboio amarelo apontou na esquina, ele sabia que a levariam e nunca mais tornariam a se ver. Ela era o que todos queriam ser e por isso a culpavam. Pra não carregar tal culpa, em galopantes doses de desespero, ela tentou nas dores se tornar como eles. E depois de muitas falhas, na conformidade da exclusão, Marianne sentia-se feliz e livre naqueles dias, pois havia encontrado nele a razão para ser quem era. Era tarde demais. Ela estava mergulhada no seu destino. Percebera então, e talvez por isso não tentou fugir, que tudo fora escrito para ser daquele jeito, num suspiro lento, numa levada de vento de uma tarde de domingo de Páscoa. Ele chorava sempre, mas naquele dia ele chorou a dor de perder um amor. E mesmo não sendo a morte, ainda fosse pois a impressão que tinha é que até a morte era mais justa que aquilo, ele estava perdendo um amor e nada poderia fazer para deter. E quando ela entrou no caminhão, mas três outros assustados e talvez tão doces e amaldiçoados como Marianne, estavam ali com bolsas repletas de piedade alheia, cheias de ódios dos outros. Em poucos segundos aquela rua maldita estava livre do mal da doce Marianne. Em poucos segundos ele perdera o amor de sua vida. O amor que a vida tão cuidadosamente guardou para ele. Aquela que o amava exatamente como ele a amava. Nem menos e nem mais. Marianne se foi e ele ganhou o vazio e a dor de uma ausência. O mundo ficou mais triste sem o brilho do espetáculo de tal amor.

(...)

24.11.06

Sem doer

Fui andando. As pessoas já não me reconheciam. Era o sinal que aquele lugar familiar já não era mais a minha casa. Então onde é a minha casa agora? “Onde estão os seus sapatos” – disse certa vez. Borrei bastante o papel e na figura abstrata tentei ver o meu futuro. Se não há nuvens, céus limpos de primavera com jeito de verão, eu me imagino no borrão. Poderia gritar que meus desconhecidos não me ouviriam. A dor é sentida assim, no doer solitário, na falta de entendimento, na apatia dos outros. A indiferença um dia ainda me mata. Me chuta, me xingue, me bata, me perca! Me estremeça! Verei amor nas botinadas, verei calor no tapa na cara amarrada pelas coisas que deveriam ser e que não são. Quanta vergonha! Onde posso me esconder? Eu queria um canto aconchegante e promessas felizes. Frutas e suas mordidas. Esse prazer, essa dor, esse sentir seja como for. E fui andando, e olhares desprezíveis para asas a muito desprezadas. Listas de adeus, sentimentos soltos, pedaços perdidos, fatias de amores enrugados, como aquele menininho amarelo que passa horas brincando na água. Na lembrança triste da morte dos gafanhotos. Nas lágrimas infantis daquelas tardes. E fui andando sem olhar para trás. Uma jamanta do Caio pode me alcançar e ainda há tempo de tentar. Podemos ser, mas ser é muito pouco. Ser muitos são. Ser com você é mais divertido. Então volte. Estou caminhando e os indiferentes fingem que não estão me vendo. Mas eu estou aqui, passos quase perfeitos, seguindo até você. Seja lá, seja cá, ou acolá. Também posso te esperar. As cortinas vão se abrir e o sorriso preciso é o meu presente maior, da vida que dou, assim, sem dor.

23.11.06

Re-, -partir. Partir, repartir. Repartições.

Eu me desfaço de vícios, finjo que não ligo e ligo quando é madrugada. Eu caminho no corredor, arrebento em meus sonhos o traidor e me perco em séries de TV. Examino de longe o coração que sofre aqui dentro. Ensaio apelos, palavras em desejos e presentes de final de ano. Me embrulho em cobertas em dias quentes pra sentir o sangue ferver. Me vejo no arco, no bonde, na rima e em tudo o que não estou. Venho e vou sem deixar rastros ou marcas bem marcadas de passos leves e sutis. Leio o que já foi lido, me perco no que não existe, grito de raiva, odeio e amo num segundo. Me desculpo, me engulo e vomito na janela que não fecho mais. Marco baladas imaginárias, danço em festas de rua no mundo que me gerou. Já como de tudo, respeito placas e suspiros aliviados. Me vejo tão longe, me perco aqui perto, invento novas rotas, corações saltitantes, promessas feitas, esperas doloridas e sorrisos de felicidade. Apelo de amor, conseqüência de uma dor linda, cor azul, verde quando vem de lá, que me alfineta, sobretudo na testa, em festas, em lugares cheios, em lugares cheios de ausências. Eu me perco nos meus dias, no sangue que ferve, na promessa que faço, na espera selada, no sonho bom dos dias eternos.

19.11.06

Vendaval

Ando inclinando para milagres. Escolho um santo, São Paulo, em fim, e espero. Talvez São Sebastião seja um santo de sonhos lindos e proibidos pra mim. Não sei se tenho a consciência doce ou se a visão está distorcida. Hoje não vou dormir com a janela aberta, o vendaval chegou. Não vou sair do meu sono tumultuado para visitar quem não me vê. Cansei de acordar assustado, então devo me cansar antes de dormir e acordar com o cabelo amassado, meias no pé, sem sonhos, sem pesadelos. Não trazem aquele comprimido de ânimo que tanto anseio. Todos esperam. Eu olho a camisa colorida que embalei o meu coração doente naquela noite e o que fazer agora? Continuar empilhando livros em busca de soluções para as dúvidas? A sensação é que o trem partiu e mais uma vez me esqueceram. Querido L, onde estás é frio, não pode zangar comigo do lado de lá. Então o Querido E, que também está longe, na proximidade quente do trópico, não mais olha como antes. Passou como lamento e me entregou ao Querido R, o mais perto e o mais longe dos Queridos. Ele guarda algo que é meu e que não terei mais. Ele brinca e posso apenas me orgulhar daquele ato de um ano atrás. Então resta o Querido J, sem saber ao certo o que fizemos um pelo outro. Na passagem branca dos dias passados, nós nos ajudamos. E agora estou aqui aguardando o chamado, empilhando livros, fechando e abrindo a janela. Vestindo meias pra lembrar da infância, desejando milagres, querendo ser feliz sem ter que jamais dizer “até logo”. Então comece com o violino, vamos fazer aquela cena pateticamente dramática que repete todas as noites em meus pesadelos. No desespero da descoberta, no amor destruído. Na roupa que rasgam a procura de provas. No sangue que escorre do nariz. Do meu olhar de desistência, no meu olhar de perda naquele olhar de culpa do outro que permitiu que a dor se instalasse. É uma loucura! Preciso dormir. Preciso daquele comprimido, será que não percebem? Preciso de respostas, preciso que veja como vejo. Não quero mais escolher sozinho. São Paulo vai interceder por mim e pode ser que ele me prenda aos seus pés. O vendaval passou.

18.11.06

Sobre meias furadas e mariposas

Já não lembro muito do lugar onde, nos meus pequenos dias, eu te vi. Era uma noite quente. Postes iluminavam a rua e centenas de mariposas disputavam a luz. Não sei porque agora penso tanto naquela noite. A sensação era muito familiar. Como se eu tivesse que prestar muita atenção, pois um dia, provavelmente agora, eu saberia de todo aquele mistério. De alguma forma eu te soube ali. Sei porque ecoou dentro de mim todos esses anos as tais luzes amarelas. Eram elas me guiando até você. Eu me tornei a mariposa procurando por sua luz. Não cansei nem em dias muitos frios. Não desisti sem nem saber que era permitido desistir. Então juntei algumas armas para sobreviver. As luzes amarelas, essa coisa doida de escrever, ouvir repetidas vezes “Calling You”, olhar o mundo pela janela, brincar na chuva, colecionar histórias, recortes de jornais, retalhos de pessoas, vidas contadas em roteiros mal escritos. Tudo aconteceu, nas curvas tortas, nas retas longas, nos retratos que comprovam, nos pedaços perdidos, em todos os dias vividos, para que eu pudesse ter essa doce consciência. E o meu desejo é que não apenas me tenha, mas tenha esse caminho, que saiba desses caminhos. Que conheça os lugares que me levaram até você. E se cheguei com a “meia furada” é porque sabíamos que só você a poderia costurar. Pode pegar em minha mão. Será eu ali, do outro lado do palco, em meio a tantos, sorrindo orgulhoso. Eu vou até lá com você. Eu vou caminhar contigo nos seus sonhos. Então não tenha medo, pois já que conhece os meus, já que conhece a minha dor, sabe que podemos dividi-los juntos. Durma em paz, vou ficar aqui velando o teu sono e quando o meu chegar, deixo apenas a luz amarela a nos iluminar.

16.11.06

Uma semana de atraso

Não sei. Não sei o que escrever. O dia até que anda passando rápido com esse horário de verão, mas são viradas de dias tão repetidos que parece que não estou saindo do lugar. É o mesmo frio gelado, a mesma porta para abrir, o mesmo bom dia, a cadeira, o vazio, o silêncio, as dúvidas. Vou pensando coisas, vou querendo dizer coisas e então me censuro, aborto, me calo, deixo pra lá. É apenas uma loucura e todos dizem que tenho que relaxar. Ouço isso com leve riso, olho pro lado e o silêncio está ali me espreitando, o silêncio preenchendo o vazio ou o vazio revelando o imenso silêncio desses dias. Viro o olho pra lá, viro o olho pra cá. Não! Não quero abrir a cortina. É a mesma árvore a cinco anos. A mesma rua, a mesma cor de céu, os mesmos carros e até as mesmas pessoas. A persiana cinza confere um tom ainda mais cinza para esses dias cinza de espera. Não que seja de todo ruim esperar, mas para a minha ansiedade, a espera é como um veneno que me consome pouco a pouco. E tentam aliviar a dor da morte lenta com otimismo, dizendo que tudo vai dar certo, que é o momento, que basta relaxar. Ok! Vocês venceram, não vou duvidar tanto de mim agora. Apesar que ontem a noite me deu um frio na barriga diferente. Aquela velha coisa de se projetar no futuro, em outro lugar que não aquele confortável em que se está e então me vi só, querendo ligar para alguém de voz confiável, de voz familiar e abraço sincero. Me vejo entre medos e ansiedades, uma combinação feroz que me joga contra a parede ainda que estático permaneça. Então posso olhar o relógio e sorrir porque é uma hora a menos. Posso sorrir com o fim do filme, passou mais duas horas. E outro sorriso porque passaram alguns minutos e estou mais próximo do reencontro do que da nossa última despedida. Depois de escrever essas palavras sem sentindo que querem desesperadamente ser compreendidas, eu me divido entre aquele que quer apagar tudo, fingir que nada está acontecendo e entre um outro que quer erguer a espada no largo e berrar para que ouçam, os que estão perto e ele que está longe, que tudo é difícil mas que preciso de compreensão. Que preciso de palavras sinceras e que não jogo mais tão bem com as mentiras. Descobri que não são promessas o que quero dele, quero apenas sinceridade para poder determinar os meus passos. Quero o mesmo que muita gente nessa rua patética tem, a convivência declarada num anel, nos anos que orgulhosamente contam, na cumplicidade sentida mesmo que atrás da persiana cinza. É apenas isso que quero, ser feliz, poder entregar o meu coração para alguém sem medos, sem essa mania suicida de achar que ele vai destroçá-lo e que o devolverá em mil pedaços. Ele é diferente e por mais que o mundo diga que não, que as experiências me digam que é inútil prever os futuros dias, no máximo se preparar para o pior, eu sei que ele é diferente. Sei por que o amo. Sei por que ele mostrou que tenho a capacidade de amar alguém e que se ele me amar também, poderemos em fim dar as mãos e viver o que sempre sonhamos naqueles dias ruins e rotineiros em que apenas nos sabíamos.

7.11.06

Eu sei de tudo.

Pediram para que um jovem rapaz escrevesse uma mensagem que pudesse ser entendida por todos os povos do planeta. E depois de diversos rascunhos, estrofes, letras, em fim ele escreveu a mensagem de amor que pôde ser facilmente interpretada ao redor do mundo.

Mal sabia aquele jovem que estaria, atravessando canais temporais e escrevendo as minhas palavras para ti. Eu sei mais do que pensas. Sei mais dos nossos mistérios e da mágica que nos une. Sempre soube de você. Eu sempre soube que tudo o que você precisa é amor.

Então abra a janela e tente me ver lá fora acenando. Estou um pouco cansado, consegue ver? É que andei muito pra poder chegar a tempo, mesmo que digam que nunca é tarde demais para a chegada de um amor. Vim até aqui pra te trazer esse bilhete que nos dará o direito a ir até Plutão. Eu vim te ver porque tudo o que você precisa é de amor.

Eu sei que houve feridas, que houve aqueles que lhe devolveram o seu coração desprezado. Era apenas uma ajudinha, uma mãozinha, já que eu estava longe de ti. Houve uma razão para nossas dores, e você deve saber disso. Saiba que fui me perdendo pelo caminho e que toda vez que me faziam crer que o havia encontrado, eu olhava a estrela mais brilhante de todo o céu, e um suspiro cafona denunciava que era a janela errada.

Tem coisas que a gente não diz. Outras a gente não expõem. Encontrei uma porção de orgulhosos no caminho que me trouxe até aqui. Mas eu me preparei tanto, olha essa roupa nova que comprei, não é bonita? Devo me calar agora que o encontrei? Posso parecer um bobo com caixinhas de madeira na mão, mas se apaixonar é se tornar um pouco bobo, então tudo bem, podem me chamar de bobo.

Abra mais um pouco a janela, tudo o que você precisa é amor. E você acredita que coube tudo dentro dessas caixinhas? Não tenho moedas. Não tenho a beleza dos belos. Não tenho impérios, nem um mundo de livros. Tenho poucos cabelos, os braços finos e um coração que venho humildemente lhe entregar porque foste seu desde sempre.

Consegue ver o meu mundo tremulando as bandeiras da alegria? Eles comemoram o momento tão esperado. Hoje os refletores estão em ti porque tudo o que você precisa é amor e está aqui o coração que bate pra te fazer feliz.

Esqueça o que passou. Era tudo história velha e repetida. Basta abrir a janela e pegar o que é teu. Eu cuidei bem dele mesmo não sabendo da beleza do vermelhinho dos seus olhos, dos dentes separadinhos, do exagero no “s”, do silêncio e da facilidade de me fazer sorrir. Eu cuidei do amor que eu tinha para dar para alguém mesmo não sabendo que era você, e de certo modo, sempre sendo você.

Tudo o que você precisa é amor. Atravessei os canais do tempo um dia e sussurrei para o rapaz que ficou famoso, “All You Need is Love”.

6.11.06

Jujubas

Eram três as opções. Eram três as possibilidades que havia imaginado. Não que tivesse controle total sobre elas, não tinha mesmo, mas roia as unhas aflito pois sabia que as dúvidas não haviam sido tão inconscientes assim. Era um estranho vicio de plantar, no pequeno vaso chamado futuro, as situações que seguiriam. Inventava situações diversas, e ouviu de certa velha certa vez que certas invenções eram perigosas. Desejar o bom caminho abre para ti o próprio caminho, reforça o querer, como gama concentrada de energia positiva, que acumulada e saída direto do coração desejoso, faz com que a possibilidade do que se quer acontecer se torne infinitamente maior. Mas sabendo de seu vicio, a certa velha sempre certa alertou do perigo que corria. Ao criar negativas projeções futuras, ele se distanciava ainda mais do seu querer. A velha até entendia, é um mecanismo arteiro, ele havia sido programado para se defender e criar certas histórias, maluquices de sua cabeça, a possibilidade escura. Era como um teste, um vestibular para o sofrimento que viria ali na frente. Desse modo, ainda que quisesse arrancar os cabelos e ver em suas finas raízes todos esses maus pensamentos, ele só queria não sofrer e para isso o seu corpo se manifestaria de todas as formas. A velha ainda disse “abrace a sua loucura antes que seja tarde demais”.
Pensou em escrever um livro. Passaria melhor o tempo e afastaria os maus e quaisquer pensamento traiçoeiro. Impossível, era superficial demais para tal, pensou. Sentia a testa quente, contorceu na cama, uma meia volta para a direita outra meia volta para esquerda. Olhou para o telefone, deve ser tarde. Fosse cedo, telefone não há. Não existe outra forma. Revirou mais uma vez e pediu calma. Olhou o teto e nada viu, apenas buracos onde prometeram um dia que seria o repouso de belos balões feitos com guardanapos. A mão acariciava o lado direito logo abaixo, tomado por medo acariciando a si mesmo. Como se sua mão pudesse entrar dentro de ti e embalar o órgão ferido. Foi quando lembrou de Caio quando este disse “feito febre, baixava às vezes nele aquela sensação de que nada daria jamais certo, que todo os esforços seriam para sempre inúteis, e coisa nenhuma de alguma forma se mais ficaria”.
Ele queria encontrar a velha e pedir conselhos. Queria que alguém sabiamente pudesse lhe dizer o que fazer. Mais sábio seria procurar uma vidente, cartomante ou qualquer pessoa que pudesse lhe dizer um simples sim ou um não ruidoso. Na verdade ele sabe que não precisa disso pra acomodar a cabeça no travesseiro, mas o encontro com a velha seria ideal. O pêlos duros no queixo pontudo da velha, que lhe pinicavam ao beijo, deixava a saudade confortante de dias não muito confortáveis. E que passado a maior dor já sentida, a dor de si em si, ele pensou que não mais haveria indecisões ou provas em sua vida. Não haveria medo depois de encarar a finitude dos dias. Errando nos cálculos, feliz como poucas vez sentira, gozando de dias lindos e perfeitos como passeio em jardim florido, ele não entendia a angústia que lhe apertava o peito e que fazia ter os tais pensamentos tão condenados pela velha. Lembrar da velha não bastava, queria tê-la, possuí-la. Arrancar a sua sabedoria, os seus segredos guardados no miúdo corpo. Ele queria ser a própria velha que tudo sabia sem nada saber. Ela havia vivido menos provações do que ele, já que viagens de navios não prova nada, pelo menos para ele. Mas havia uma coisa na tal velha, um sentido primitivo que o fazia querer ser menos complicado e viver como ela vivia.
Pensou nas poucas vezes em que amou e não foi amado. Pensou nas outras vezes em que o amaram e ele não amou. Toda a dor está ai, nesses desencontros. O fato é que ele amava, e nas ocasiões em que permitiu que isso acontecesse, o final não era o esperado, mesmo assim era o imaginado. Estaria então a velha certa? Estaria ele provocando em seu pensamento doentio a febre de futuros rompimentos? O fato é que ele assistiu a muitas novelas. Criado por mulheres novelescas, com quedas ao melodrama. E já moço, foi encontrar repouso no cinema, sim, já que novela era coisa menor. E viciado em histórias que não davam certo, emocionado com o que não foi, tornou-se cúmplice da infelicidade plástica de seus heróis. Admirador da triste beleza que a tristeza carrega. Naquela lágrima presa ao olho, na cafonice da partida, de um abandono, no sentimento destrutivo da auto-piedade, sim, pois ele se vira exatamente ali, projetado na tela. Vivendo aquele sofrimento atuado poupava-se de vivê-lo na carne. Estava poupado e pronto!
Mas era diferente, ele amava e ensinaram que amar é perigoso. Lembrou de Cecília, a bela menina que sofrera por ela anos antes, e pôde sentir sua dor. Sabia que só sentiria a dor de seus amados quando amasse de fato. Então já não havia como ter auto-piedade. Porque se não amara antes, como sofrer pelas vezes que amou e não foi amado? Sim, ele havia transformado paixões em amores, amizades fortes em amores, sentimentos belos em amores, mas amar, como estava amando naqueles dias, jamais.
Seria esse o medo? A velha sábia tinha previsto esse dia e antes de partir, ainda que com o olhar triste, o escolheu entre outros treze. Era a ele que ela daria o dom do amor e assim, todas as alegrias e dores que ele proporciona. “Tudo o que você vai fazer daqui para frente será por amor”, como dizer isso a uma criança da forma que deve ser dita? Ela arriscou em deixar-lhe sua herança. Ainda que tenha levado a sua sabedoria, ainda que não tenha deixado segredo algum, ela fizeste, com o coelhinho de cartolina nas mãos a previsão que agora, ele, revirando em lençóis verdes, conseguia entender.
Viver é desviar das dores ou viver é fazer o que a maioria não faz? Eram três jujubas. Três opções. Uma jujuba azul, uma jujuba vermelha e outra jujuba roxa. O homem olhava com extrema paciência. Com a perna cruzada, olhar sereno, fumando como fumam os atores de cinema, virando a cabeça pra fumaça sair de lado. Ele esperava paciente a decisão do escolhido da velha. Escolher nunca era algo fácil, não para ele. Escolher era sempre perder. Nunca se prendera ao que ganhava, havia mais valor o que perdia e talvez ai more o fetiche pelo sofrimento. Mas as três opções eram de outra espécie. Eram decisões que em partes, a não ser uma das jujubas, não cabia a ele. E que, por ter pensado demais, por talvez não ter se preparado como sugeriu a velha, haveria de passar pelo sofrimento de escolher a jujuba errada. Foste ele que imaginou, então que ele arcasse com o que viesse depois. O homem fumante pouco se importava, era apenas o mensageiro da cabeça descontrolada do outro. Eram três jujubas e apenas uma escolha.
“Vou dizer-te sem muita demora”, disse o homem, “na verdade refrescar seus próprios pensamentos, há de escolher e digo que tens 1/3 de chances de fazer a escolha certa, se é que nessa sua mente doente haja certo ou errado, e assim, sobra-lhe 2/3 de escolhas, que tenho para mim, como as erradas”. Aquilo não poderia estar acontecendo, ele só queria ser feliz, havia vivido tudo até ali por amor. Tudo bem, tudo bem não de forma consciente, ouviu aquilo da boca murcha de uma velha enrugada como frase qualquer sendo dita por quem já não é dono do raciocínio. Era o seu castigo, pois é muito fácil dizer que tudo sabia agora que tudo acontece, e como ele sempre se punira, era o que ele a si fazia naquele momento.
“Escolha uma e fiquem juntos. Escolha a outra e você desistirá. Por fim, escolha a última e ele o deixará. Simples. Três possibilidades. Três chances que você inventou. Agora viva uma delas”. Como saber?, ele pensou. Se tudo aquilo era invenção de sua cabeça, ele haveria de encontrar um modo de se enganar. Ele deve ter deixado alguma pista. A jujuba azul é anis e ele detesta o gosto do anis, porém azul é a sua cor favorita. Assim como o vermelho, cor querida, a jujuba deve ser morango, ou cereja ou framboesa e todas eram saborosas, mas nada igual como a de uva, a roxa.
Ele então chorou. “Não se desespere” confortou-lhe o homem. “Com não me revoltar com a crueldade de tal jogo! Como não me desesperar diante ti? Diante de mim? Eu estava tão cansado, havia provado o gosto amargo do futuro vazio, a beleza havia se perdido e quando eu permiti, quando encontrei o amor encontrado arrumaram uma maneira de destruir tudo! Não basta o que eu passei? Não basta o sofrimento daqueles dias? Não bastou aquilo tudo para me provar? Eu sai da roda! Sai dela! E pude em fim respirar e foi quando ele sentou do meu lado que eu senti o coração bater novamente. Eu sai da roda como vocês recomendaram! E agora tenho que escolher? Que fim injusto para um tolo apaixonado como eu”.
O silêncio do homem que já não fumava mais era o oceano, só que sem o chiado das ondas. Percebeu que não sairia dali sem fazer uma escolha. Seu Deus havia morrido a muito tempo e então prendeu-se nas palavras que ouvira no ônibus. Naquele reencontro inusitado, da voz que lhe dizia jamais ter sido esquecido quando parte da dor que lhe consome é ser esquecido. É nela, na certeza ainda que sem caminhos claros, que tudo dará certo se ele ouvir o coração. E foi assim, com o coração, com a coragem que não lhe falta, ainda que afogado em medos, que ele escolheu a jujuba e pode em fim dormir.
Perguntem a ele a jujuba escolhida.

31.10.06

Entre por essa porta...

O infinito daquele azul não me diz mais nada. Vontades sufocadas, escadas que não consigo alcançar, a inquietude que não termina. Elogiaram a minha intuição e mesmo sabendo de toda sua funcionalidade, algo engasgou no peito. Alguém soque as minhas costas, arrebente meus músculos tensos, faça sair de mim essa coisa que não é de mim. Faça sumir esse desespero plástico, essa lágrima que tende a conhecer a pele fria e triste. O riso sai desistindo, arrependido de não ter sido o riso que se esperava. Mergulhado em caricaturas, em sonhos que não os seus, em palavras recortadas e picotadas, imagino a projeção de dias que virão. E entre o que não devo pensar e o que quero que aconteça, me perco nessa luta de lutar todo dia contra os fantasmas, os medos, os velhos medos, os mesmo medos. E no silêncio, estranho silêncio que quero rompido, nas surpresas que deveriam surgir, eu agora mais espero do que vivo. Esperar não é viver, mas por vezes é preciso esperar para viver o que sonhei.

29.10.06

Corda bamba da auto-sabotagem

Quando, num futuro próximo, eu receber a mensagem que eu mesmo me enviei, saberei dizer mais sobre mim e minhas verdades. Eu tinha a complexidade otária de complicar as coisas. Confesso que ainda tenho um resquício desse triste desprazer e preciso de ajuda para me deter. Desisti muitas vezes. Desejava ser comum por mais que comum não houvesse em minhas formas. Eu sempre quis ser o outro que não era eu. E assim, de dor em dor, de partida e desistências, eu tentava, ainda que de teimoso, fazer-me diferente. Chegar a quem se é não provoca bolhas nos pés ou calo nas mãos. Ser a quem se é, experimentar a pura sensação de liberdade pertence a todos. Acontece que alguém um dia inventou de se distanciar dela e todos os outros, seguidores burocráticos, insistiram de fazer igual. E nesse efeito dominó, coisa de séculos ou dias, eu me vi querendo repetir as repetições repetidas dos artistas. Me vi querendo o que não queria, como postar-se diante de imensa mesa e vomitar nas porcelanas antes de servido o banquete. Se fartar de vomitar coisas, abandonar pessoas, desistir de planos, abortar projetos e sufocar sonhos. Isso é o que é viver para muitos. A dor esconde-se na falta de dúvidas, de tédios, de amigos cretinos. Eu quase me afundei na imensidão dos perdidos, e hoje me encontro entre duas forças que me empurram em sentidos opostos. Tenho um novo sentido e novas cortinas se abrem. Ele baila meio descompassado, sorri tendencioso, insinua saber onde esses passos nos levarão. E eu, inundado de pequenos medos e grandes esperanças, tento enxergar como meu querido estranho. E em seus passos, ainda que desastrado, tento me encontrar. No seu ritmo, no seu jeito doce de me chamar de anjo. Eu preciso de um pouco de calma, de muito entendimento, de uma mão estendida e um copo de suco. Eu preciso tirar a coragem que tá escondida lá dentro daquela caixinha e abrir a vento. Permitir que ele me carregue, que mostre o caminho que sempre sonhei seguir. Está muito próximo, posso tocar. E tenho medo, pois quando isso aconteceu, certa vez esquecida, o toque não foi o suficiente. Ver fugir de ti os sonhos que te ensinaram a pisotear? Não é a sensação que quero sentir. Talvez seja por isso que nobres anjos assoprem com veemência que devo seguir mais uma vez o meu coração. De mostrar, para o sujeito que abrirá sua própria mensagem no futuro vindouro que ele estava certo. Que foi a opção acertada, pois encontrar um amor como esse não é para qualquer. Para você, que sabe de todo o meu sentir, só me embale com seu jeito jeitoso, me mostre a nossa calma e nos levará aos dias calmos sempre esperados.

28.10.06

Retrospectiva ou O Melhor e O Pior de mim

"As pessoas estão ocupadas demais para nos surpreender, ou envolvidas em seus problemas inventados".
"A gente acha então que nunca mais vai ser feliz. Que foi tão bom e perfeito, tão único e mágico, que jamais algo parecido irá surgir na nossa vida. Eu estive, por um tempo, guardado aguardado dentro de velhos guardanapos. Estive preso em momentos do passado, em lembranças boas, em medos frágeis e em sonhos impossíveis. Estive acreditando e desacreditando. Dizendo não quando na verdade queria dizer sim. Uma vez lá em cima, outra vez lá embaixo. Tudo muito contabilizado, pesado, registrado, calculado. Vida sem graça que se ia perdida e achava em roteiros mal escritos, e-mails jamais enviados e telefonemas para sempre esperados".
"Há uma graça nisso tudo. Há algum encanto desencantado enterrado em alguns desses parágrafos, cenas, linhas, cabeçalhos. Há saudades e reticências. Há três pontos, vontades inusitadas, acentos mal acentados, pontos finais em lugares equivocados, vírgulas com nome de anjo, anjos querendo ser vírgula, palavras por palavras, e finalmente, apenas palavras".
"Não quero mais viver tudo no cara-a-cara. Há momentos que posso viver sem correr riscos maiores. Há coisas tão condenáveis em outros tempos que posso fazer agora sem maiores ressentimentos. No branco eu crio o meu mundo, a minha fuga e tudo o que eu quiser".
"No momento em que se foi, fiquei meio oco por dentro. A imensidão da beleza de um sentimento que se perdeu. Que deixa a marca marcada viva e morta dentro de algo que já não existe mais".
"Estranho ser você e não te querer. Estranho rejeitar o que mais se quer. Calar num peito trancafiado. Há uma beleza nisso. No rosto sincero dessa perfeição. Sim, é você que amo, mas é você que finjo não querer".
"Se todos os nossos sonhos fossem como sonhos de padaria, que sonhos compraria?".
"Lá fora, o calor, dentro do carro, aquela tristeza “nossa” carregada à força. Aquele “lutar” já vencido. Uma sensação azeda de perda, de vazio, de regresso, de voltas e mais voltas".
"O olhar que eu não conhecia. Dentro de mim já existia. Era meu amigo invisível".
"Mesmo na curva do amor. Mesmo sendo a ponta quebrada de um triângulo. Algo sei que vou guardar".
"A espera é dolorida. A dosagem, nem sempre é precisa. Mas a ausência, essa é necessária. Só assim saberás se me tens... Só assim saberei se o tenho. E ao fim, saber que ninguém sabe nada...".
"Não caíra no esquecimento. Não se apaga o beijo bem dado e o seu olhar calmo. Há retalhos arrancados de mim. Pedaços de vultos e de saudades com nomes e metades que levam o melhor de mim".
"E perdido em mundo novo, e sentido em sentimentos soltos, ele inventou de aceitar seus desejos. Ele criou um mundo seu, uma tecnologia barata, bordada a mão, feita sem esforço, palpitações únicas, necessidade pulsante do seu redescoberto".
"Hei de me perder, de me lembrar e de te esquecer e de desejar o inverso, todo o resto, e sufocar até morrer mais um pouco".
"Tente recusar só aquele imundo lado, mas não recuse a mim. Sou mais que isso. Posso ser mais".
"Um silêncio adorável e um abraço gentil. Um carinho perdido e logo um brilho encontrado. Uma eternidade em segundos. Um ter meio não tendo naquela noite de verão".
"Havia um lugar onde fitinhas multicoloridas enfeitavam os cabelos. Havia um lugar onde a tristeza era um combustível, onde se enganar era a melhor forma de ser feliz. Havia um lugar e nele tudo podia acontecer. Inclusive o nada. Nesse se perder e se achar e se perder de novo, ele perdeu a conta das perdas. Ele perdeu a conta das pedras. Ele perdeu a conta de quantos pedaços seus levaram embora".
"Suspirei por perdas irreparáveis. E sobre as minhas escolhas vi refletido a imagem de alguém eternizado por suas escolhas".
"E quando não há mais nuvens e nem estrelas e nem pipas e nem pássaros, as razões se perdem. Quando não se consegue lidar com as pessoas, quando as pessoas não sabem se desvirar, é hora de partir em busca de si mesmo".
"Sonhei com dias melhores. Sonhei com pessoas queridas, com situações imaginárias. Eu me inventava ao seu lado. E inventava outros. Criava situações como num filme. E eu era feliz. Feliz sonhando que gostavam de mim como eu era, e que não pediam nada em troca pra isso. Uma brincadeira solitária".
"Queria um coturno, um sobretudo, uma música triste borrada pra mim e um sonho bom. Queria viver de planos, projetos, rascunhos de projetos e projetos de rascunhos de projetos. Viver de mentiras, ainda que verdadeiras demais. Fugir das verdadeiras, principalmente das falsas demais. Pular amarelinha aos sábados. Perder guarda-chuva na segunda e pegar na sua mãe na quinta".
"Deveria existir um vácuo, um buraco negro entre uma relação e outra. O mundo deveria ser devastado por uma bomba atômica louca assim que descobrimos que não somos mais os culpados por calafrios, batedeira no peito, tremedeira nas pernas ou ereção fora de hora. E só voltar a ser mundo quando, após uma noite quente e íntima de sexo surpreendente, ouvir um sincero “eu te amo”.
"Ninguém se separa. As pessoas se abandonam. Essa é a verdade, a verdade verdadeira. O amor pode ser recíproco, mas o fim dele não, nunca".
"E o mundo para um desprotegido é assim, uma imensidão de coisas novas que ora nos assustam ora nos possuem. Um vagar pela verdade, entre a realidade e a dor de toda essa vida. Um sentimento de ser dono de si e não ser dono de nada".
"Busquei nos outros o que estava vivo em mim. Passei minha vida sofrendo por outros, é a primeira vez que sofro por mim".
"Eu sei que é tudo confuso. Não sei o que será daqui para frente. Ainda não sai lá fora, não vi as pessoas. Algo dentro de mim diz que nada vai mudar. Mas que estranhamente vai mudar pra melhor".
"Agora é que quero viver. Nesse tempo certo-incerto que foste desde sempre e que agora surge pra mim como um desafio bom de querer pessoas boas e bons momentos".
"Pensei em tanta coisa e ao fim não pensei em quase nada. Os dias são assim, intervalos de tudo e de nada. Uma brincadeira de inventar o futuro, sonhar acordado, imaginar lugares, pessoas e situações. Um projeto audacioso de querer, de querer mais aquilo que se desconhece, como muitas das coisas que penso e que não penso a fundo".
"Poderia estar sofrendo agora. Chorando ao volante, sendo um bom exemplo de como é triste ser adulto. Que ser adulto é conviver com noticias ruins, ver o lado bom delas, sorrir quando tudo diz não. Ser adulto é viver se acostumando. Acostumar com a infância que passou, com os problemas, os vírus, o trânsito, a poluição, os idosos varrendo as ruas, tenho que me acostumar com tudo isso e ainda sorrir".
"O que sinto é sempre mais forte. O momento pede para ser revelado no meu ritmo. Eu já sei que o mundo é bem mais que o que vejo pela janela. O som pode ser mais que silêncio".
"Hoje sou um substituto de mim mesmo. Um amor substituindo as dúvidas de uma vida".
"E nesse novo outono, novos dias de uma vida quase nova, os temores são grandes e o poder do adeus é coisa que persiste. Uma despedida a cada esquina. Uma última vez tímida e secreta, pra não maldizerem do que sinto e assim vou vendo e vivendo esses dias nublados. O frio se estende e percorre as noites quentes, de pele molhada e mal estar intenso. Parece que vai explodir, voar pedaços coloridos por ai, lenços e mais lenços por um olhar apagado".
"Reunião de amores. Sorrisos limpos e abraços sinceros. Tudo assim, bem simples e verdadeiro. Sem poesia, meio seco, no que é. Não são relações imaginárias, sentimentos idealizados. Não são personagens de roteiros mal escritos. São amigos. São pedaços de mim".
"Não creio mais nas suas palavras e ainda assim, moras dentro de mim".
"Vou em busca de mim, desse algo que brilha além dos muros".
"Como disse, há exageros. Sou assim, um exagero em duas pernas, poucos cabelos, sorriso largo e olhar curioso. Sou um pouco tudo e muito de nada. As vezes fica a impressão de que sou o oposto do que mostro, mas atente e me leia uma, duas ou até três vezes com mais calma. Inverto muito e isso confunde".
"O recente mal deveria ter me condenado, mas na loucura toda dessa minha vida, essa coisa microalgumacoisa trouxe de volta ou trouxe de vez essa vontade de ser e de viver mais que nas palavras e nos desejos".
"As más noticias foram em fim despejadas nos passados amores. Difíceis palavras, estranho momento de revelar o que doces dias nos trouxeram. Um a um e eu vou ficando só".
"Gosto de coisas consertáveis. Mas nem tudo pode ser consertado".
"Eu poderia fazer coisas mágicas e terríveis com alguém do meu lado. Posso insistir que o homem não foi na Lua, ver todo mundo irritado e me achando um boboca, não importa, comam torta".
"Não há mais o que temer. Escreva lindas palavras. Já não há sentimentos para poder recriminá-lo e assim, nem para amá-lo".
"Quando se perde a bela cena que nos envolve, que nos instiga, que nos ameaça, se esquece o futuro e os caminhos que nos levam até lá".
"Cadê a poesia? Socada numa bunda qualquer que senta apoiando os risos falsos, as felicidades amarelas, coisas limitadas e tristes vidas longas mal vividas".
"E ainda tenho que conviver com a piedade, porque é o que fazem, lêem um troço desse que estou escrevendo e ainda sentem dó de mim. Se for meu amigo me liga e não diz nada, ou melhor diz o seguinte: “Vai tomar no cu! E se arruma que a gente vai no cinema!”.
"Se tenho que conviver com os meus medos que é morrer, sentir dor e ficar sozinho, então vou selecionar mesmo, o que de pior poderia me acontecer?".
"A claridade não perturba, vai me convencendo, me ganhando, me tendo de novo no meio de suas coxas macias e suadas. Escorrego pro lado de lá e já posso dormir mais tranqüilo. Tão perto e próximo ao principio abismo. Só vou voltar pra matar a saudade, pra lembrar como era bom. Me puxa pra dentro, bem devagarzinho, sem choros e esperneio. Fico de conchinha, cochilando bem mansinho com todos os diminutivos bonitinhos que juntei pela vida".
"Mas hoje, porque duvidar da fé das pessoas? Eu acredito que um dia vou conhecer alguém que goste de mim como sou e que vou retribuir tal pessoa com o mesmo sentimento, isso não é fé?".
"Igualmente recuso a dó, a piedade, a solidariedade barata e o assistencialismo patético. Recuso os amigos falsos, as lágrimas pedantes, as desculpas inventadas e o perdão fingido. Recuso o interesse cruel por minha dor. Recuso o olhar curioso, o toque receoso, o excesso de zelo, o papo contido a distancia calculada".
"Tenho um olhar muito simples para as coisas. E temo, com isso, simplificar o mundo".
"O nosso tempo a gente inventa, e você inventou que ele acabou".
"Hoje foi um dia bom. Dia-pós-dia-maravilhoso. Acordei com seu cheiro. Com gostinho de quero mais. Levantei meio anestesiado. Passei o dia tentando entender tudo o que aconteceu ontem. O mundo na segunda e eu ainda perdido no domingo".
"Tenha consciência que sempre vai haver alguém na contra mão do amor. Alguém sempre vai se perder na próxima curva, mas que ao fim, tudo ficará bem".
"A foto do amável desconhecido colore sonhos permitidos e traz novidades degelando as calotas de sentimentos empilhados no canto escuro do último quarto no último andar do último prédio oposto àquele onde fica o adorável apartamento azul".
"O desconhecido toma a forma que quero, caminha pelas calçadas de meus dias, me faz sorrir e me querer bem e melhor".
"Eu te entendo. Acho que entendo. Compartilho da mesma cafonice bamba, de suspiros quase adolescentes, de crenças quase impossíveis. Desse gostoso vicio de te sonhar acordado em todos os lugares, em todos os momentos e assim te ter ao meu lado por dias, por todos os dias, nas idas sem vindas. Nas idas e apenas idas".
"É a alegria que não posso tocar, que está longe e que me fascina por isso. Por me tocar, por me encantar, quando tudo aqui perdeu a graça, onde os braços ficaram curtos e os corações apertados para me acomodar. E nesses dias onde só se crê no que se pode ver eu vejo você, nos sonhos que quero ouvir e na mão que posso tocar".
"Não posso me deixar vencer pela racionalidade chata alheia daqueles que já não acreditam no doce da melancia. Há uma doçura, ainda que se ache amarga, lá do outro lado, abaixo dos braços abertos. Está lá, do lado de lá da tela, do lado de lá de tudo e não se tem distância pra isso. Está longe e ponto. Pode ser cerca, parede, muro alto, ponte, está sempre do lado de lá e eu do lado de cá".
"Se já não me entendem já não posso estar entre eles".
"Uma perseguição constante pelo seu nome, pela sua figura, sua risada, suas histórias, tudo aquilo que não sei e que nem sei se vou saber".
"Acho que vou ver o mar, sentir a areia, ficar horas deixando o mar me levar pra depois me vomitar de volta. Vou lá me despedir de algo que não terei mais".
"Os mesmos delírios desconexos. As imagens do nada querendo dizer tudo o que se esconde lá dentro. Sou um pedestre invisível, e mesmo assim ando sempre pela calçada. Pegue em minha mão, estou programado para amar, programado para amar do amor tranqüilo".
"Eu sou assim, insaninho de palavras hábeis, coração na ponta da língua e língua no dedão do pé! Eu sou isso, percebe a dimensão da loucura?".
"É o mesmo azul, o mesmo desejo, o mesmo desejo de só querer assistir o mundo mas não fazer parte dele".
"Não tirem a beleza dos dias calmos. Eu girava com o mundo e agora ele gira sem mim".
"Sou a exceção no seu mundo de não. Sou o feliz que pode sempre lhe sorrir e dizer sim".
"Cheguei em casa e o seu cheiro está aqui. Nos travesseiros. No lençol. Nas paredes. Há você aqui em todos os cantos. Nas músicas que levou, no roteiro, em mim".
"O tempo que nos resta é muito tempo. E a distância que nos separa, muito curta. São 18 milhões de pessoas e eu estou no meio delas e quem consegue me alcançar é você que está do outro lado da fronteira".
"Não quero um outro olhar, um outro sorriso, outro sotaque que não seja o seu. Não quero outro sonho que não os que poderei dividir com você".
"Viver faltando um pedaço é viver sem pensar no pedaço que falta"."Eu procurei você quando nem sabia que você era alguém. Procurei quando nem sabia que você era você. Procurei sem saber que procurava".
"Porque se brega é se apaixonar todos os dias pela mesma pessoa, então eu sou o brega mais feliz do mundo".
"Eu posso dizer que fui salvo. Eu posso dizer que no momento em que vi a luz e ele estava lá, cansado e sorrindo pra mim, eu tive naquele momento a vida devolvida. E por isso os meus dias serão pra ele".
"Acabaram os dias de espera. Os dias bons passaram, é passado. Os dias de felicidade infinita estão apenas começando".
"É um sentimento calmo, sincero e que cresce na proporção da distancia. Não há nada que nos separe. Quando um acredita, é a possibilidade do amor. Quando dois acreditam, é o próprio amor".
"Eu cheguei para o meu amor e nunca é tarde. Cheguei e agora quero ficar".
"É o momento de ser feliz e de repousar tranqüilo no colo de um amor esperado".
"Perguntei a mim mesmo e a resposta veio macia em ouvidos duros. E entrando com o vento lento, em movimentos leves e intensos, como onda invisível e distinta do ar que lhe cerca. Foi entrando e contornando os medos e os terríveis questionamentos. Foi desendurecendo coisas a muito endurecidas. E ouvindo tua própria voz, palavra bem cantada, nuvem de bom sentimento, ouviu de si a razão de si. “Eu o amo. Eu realmente o amo”.
"Eu tive sonhos e hoje eles deixam de ser sonhos. Coisas tão perfeitas e que de tão perfeitas, assustam. Certas Coisas tão bem colocadas, tão bem feitas pra mim, só pra mim, tudo aquilo que eu só via do outro lado da projeção e que hoje, de forma mágica, se projeta dentro de mim".

26.10.06

Sou um cachorro no cio?

Um dia eu ascendi uma vela e rezei pra lua que não mais me preocuparia com os olhares alheios. Existiu um dia, dias perfumados pelo perfume doce da confidente de cabelo engraçado, que eu prometi que buscaria a tranqüilidade nas essências. Acontece que estão me olhando como um cachorro no cio, e por mais que eu tenha feito promessas, esses olhares me fazem pequenino, fazem voltar os cinco anos. Então ou eu sou um cão no cio ou uma criança de cinco anos com o nariz escorrendo. Eu assistia Bagdad Café e tinha sonhos que hoje acontecem com o meu toque, em rápidas palavras e em fotos mal tiradas. Eu tive sonhos e hoje eles deixam de ser sonhos. Coisas tão perfeitas e que de tão perfeitas, assustam. Certas Coisas tão bem colocadas, tão bem feitas pra mim, só pra mim, tudo aquilo que eu só via do outro lado da projeção e que hoje, de forma mágica, se projeta dentro de mim. E talvez, a facilidade com as letrinhas, não traduza tão fielmente um discurso que pode até parecer reciclado, copiado de outros discursos de outros dias meio vividos. E por mais que eu tente provar que não é uma repetição, eu me tornei um Paco no cio ou um Pipinho no jardim de infância. Meus sonhos são diminuídos à pequenas insanidades, como utensílio de moda ou estação do ano, logo passa. Não culpo os meus observadores, eles não ouvem ou sentem o que eu posso sentir. Eles não ouvem o chiado do mar perto mesmo estando longe. Por mais que eu fale, que escreva coisas como essa, eles jamais saberão o que mora agora dentro de mim. Recorro a todos os meus anjos na busca de saídas e soluções, vejo o esforço dessa massa feliz coletiva tentando me empurrar do galho pra alçar vôo. E é quando me dá o medo, pois a gente aprende desde que nasce a duvidar de tudo aquilo que é perfeito. Eu tenho medos, eu sou normal. Não, eles não me dominam ainda. Sim, eu continuo sendo normal. O fim de ano é assustador, ele nunca me abraça. E temo que o fim do ano seja mais uma passagem triste de sonhos que não deixaram de ser palavras. Mas vai dar tudo certo. Um dia vão poder me olhar diferente, não como um cachorro no cio e sim como um cão feliz abanando o rabinho de felicidade.

22.10.06

Váatéteumoço


Quando penso em alguém só penso em você e ai então estamos bem”. É a frase mais verdadeira que existe nesse momento pra mim. Tudo bem que ainda não passou o efeito da pressurização da cabine. A viagem foi rápida, mas o suficiente pra me conceder respostas dignas. Estou feliz e isso é fato! Discorde e vá brincar com sapos! A loucura está além de vossos olhos, então como me acusar de um crime que desconhece? Estou fazendo a coisa certa caro pirralho de cabelos grisalhos. Ô sim! Grande Mestre dos Abaetés Maduros! Quem diz o que não faz já está querendo deduzir o que vai fazer! Eu já disse que vou e está encerrado. Arpoador que me aconchegue na pedra fria da noite que vira dia. E me prometa que não vai faltar rimas, cantigas e biribinhas. Deixe as velhas discutirem, não se apegue na bateção e escute mais o que te diz o coração. Há um Moço encantado, se sorriso prateado, o sotaque é engraçado, chia como a onda do mar. E ele está lá esperando o Moço. Sentindo a saudade que sabes bem como é. Te procura no teu cheiro e não há nevoeiro que não se note tal amor. Perguntei a mim mesmo e a resposta veio macia em ouvidos duros. E entrando com o vento lento, em movimentos leves e intensos, como onda invisível e distinta do ar que lhe cerca. Foi entrando e contornando os medos e os terríveis questionamentos. Foi desendurecendo coisas a muito endurecidas. E ouvindo tua própria voz, palavra bem cantada, nuvem de bom sentimento, ouviu de si a razão de si. “Eu o amo. Eu realmente o amo”. Saiu repetido seguido de um riso estonteante, olhos fechadinhos e um olhar cambaleante de felicidade. O anjo postado em forma de amigo querido, abre seu peito e te encolhe lá dentro. Sem mimos e exageros, o anjo lhe entende na forma mais absurda de entendimento. O olhar vai dizendo, o coração salpicando e a resposta veio. Não há mais dúvidas. O teu caminho tá pronto Seu Moço. Não volte sem o outro Moço e pequenas abelhinhas. Tem Sol do lá de lá, passe o tal do protetor solar. E seja feliz. Serei eternamente feliz.

21.10.06

Até mais, Ibirapuera

- Você está bem?
- Sim, só preciso sair um pouco.
- Você nunca me liga.
- Eu não ligo pra ninguém.
- Do que você está precisando?
- Que idéia errada que tem de mim.
- É o que me faz pensar. Se não liga pra ninguém e resolve me ligar é porque quer alguma coisa.
- Não é verdade. As pessoas mudam.
- Por isso que gostam tanto de você. Por causa da sua incapacidade de mudar.
- Já leu Caio Fernando Abreu?
- Algumas coisas, por que?
- Tem uma frase dele que diz assim: “mudei muito e não preciso que acreditem na minha mudança para que eu tenha mudado”.
- Ok. Você mudou e estou quase convencido disso, o que quer comigo?
- Quero dar uma volta.
- Comigo?
- Sim, com você.
- Jamais pensei que esse dia chegaria, tanto que te chamei para essa voltinha. Tomou algum pontapé na bunda ou algo parecido?
- Você ficou ácido com o tempo.
- As pessoas mudam.
- Estou indo embora para o Rio.
- Você?
- É. As pessoas não só mudam. Elas se mudam ás vezes.
- Quando?
- Agora. No inicio do ano. Então, quer me ver?
- Quero. Onde?
- Ibirapuera. Na Praça do Porquinho. Te espero.

(...)

- Olá!
- Oi.
- Que frio!
- É, tá muito frio.
- Vai sentir falta?
- Do frio?
- É.
- Não sei dizer. Acho que sim. Sinto falta das coisas.
- Sente falta de mim?
- Sim, e você?
- Sabe que sim.
- Agora eu sei apenas o que as pessoas me dizem. Prefiro não adivinhar o que elas pensam.
- Mas você sabe que eu sempre te amei.
- Acho que nem você sabe disso. O que temos é um carinho grande.
- Fale por você.
- Sinto um carinho enorme por você e por isso o chamei aqui. Poderia ter chamado milhares de outras pessoas antes de partir e escolhi você.
- Por que está indo embora?
- Hoje eu sei porque te deixei.
- Por que está indo embora?
- Eu o encontrei.
- Você é maluco.
- Essa é uma das razões. Você não era maluco o suficiente para mim.
- Qualquer um acharia isso bom.
- Não eu.
- Você nunca desistiu, não é?
- Nunca.
- Como sabe que o encontrou?
- Sabendo.
- Eu não fui “ele” um dia?
- Não.
- Então por que ficou comigo.
- Por um instante pensei que não o encontraria. E você era bom o suficiente pra calar a minha busca.
- Você me chamou aqui pra isso?
- Não. Sim. Não. Não sei.
- Eu ainda tentei ficar com você mesmo depois de tudo.
- Por que? Por que queria ou achava que ninguém mais ficaria comigo?
- Porque eu te queria.
- Eu sei e achei lindo o seu gesto, mas não era você.
- O que está tentando fazer? Me libertar?
- Veja como quiser ver.
- Eu já não te amo como amei um dia.
- Eu sei.
- Então não tinha porque me chamar aqui pra contar das suas maluquices.
- Não é o que você está pensando.
- Ir para o Rio de Janeiro atrás de uma pessoa que você sabia que existia e que só não sabia o nome, o sobrenome, se gostava de geléia é maluquice!
- Tanto eu sabia que ele está lá me esperando agora.
- Qualquer um que aparecesse você diria o mesmo.
- Eu disse pra você?
- Não.
- Sinto muito.
- Tudo bem, desculpe.
- Eu precisava lhe dizer. Não posso partir sem antes deixar claro que te deixei porque ele estava me esperando.
- Antes pouco me importava porque você havia me deixado. Você me deixou e nada mudaria. Mas se diz que me deixou para encontrar o seu desconhecido e isso aconteceu, fico feliz por você.
- Obrigado. Você não mudou nada.
- Você também não.
- No nosso caso é bom não mudar, não acha?
- Acho. Prefiro você assim.
- Hoje eu sou quem eu sempre quis ser.
- Dá pra ver nos seus olhos. E São Paulo?
- Amo São Paulo. Paulista, Consolação, Liberdade, vou sentir falta. Mas o meu coração me manda pra lá.
- Sempre admirei pessoas que seguem o seu coração.
- Eu preciso ir. Não posso ficar aqui e pensar o que teria sido se eu tivesse ido. Não faz sentido agora. A minha felicidade está lá, num sorriso lindo, de sotaque mágico, é o que quero.
- Vou sentir a sua falta.
- Eu também.
- Que tal andar de bicicleta?
- Acho ótimo.
- Ei, você o ama?
- Sim, muito, como nunca amei ninguém.
- Então ele é um carioca de sorte.

19.10.06

Arpoador

O mundo disse não e eu sorri mesmo assim. Viraram as costas e eu fiquei ali esperando a minha vez de entrar. Eu quis muitas coisas em outros tempos. Eu fiz planos numerosos, imensos desejos e detalhei tudo o que não conhecia, tudo o que não sabia, o que não queria. Eu rimei batata com pirata, árvore com espinafre, sapato com apertado, guarda-chuva com coisa nenhuma, amor com amor e somente amor. Disseram não e eu insisti. Uma birra pirracenta de querer mais e de querer tudo. Ainda quero um sobretudo, um coturno e uma música triste borrada pra mim. O sonho bom já é realidade, assim como os planos, os projetos, os rascunhos de projetos e os projetos de rascunhos de projetos. Agora eu conheço o Rio e o meu coração segue dividido entre a Cidade Maravilhosa e a Terra da Garoa. Tenho um amor e só falta o jardim. Tenho o amanhã e tenho o olhar que é só pra mim. É a hora de colocar em prática tudo o que colhi pela vida. É o momento de ser feliz e de repousar tranqüilo no colo de um amor esperado. A vida da gente é assim, ou pelo menos, de todos deveria ser assim. Reencontros, ainda que demorados, dos amores esperados. A risada da minha mãe me fascina e as piadas do meu pai me iluminam. A Eva e o Tobias me dão vida. E meu amor me faz sorrir. Que bom, porque sorrir é e sempre será, cool.

10.10.06

Para a pequena Eva

Eu sou o Clau. Eu poderia ser qualquer outro mas eu sou apenas o Clau. Filho de um padeiro comunista que sonhava ser palhaço e de uma delicada mulher com alma de artista que faz-de-tudo-um-pouco-e-muito-bem. Com esses dois exemplos dentro de casa, desde pequenino aprendi que existem muitas coisas no mundo mas que se vale a pena mesmo é procurar pelo nosso amor. E eu procurei por ele nos meus brinquedos, nas brincadeiras de roda, nos bancos da escola, nas férias de julho e nas de dezembro também. Procurei o amor comendo suspiro doce e ouvindo Biafra escondido dos terríveis adultos. E sem saber que o procurava eu juntei umas coisinhas especiais que carrego comigo até hoje. Para procurar por um amor nada melhor do que amar e o amor me levou até as melhores pessoas. A família querida, os amigos do peito com os quais vivi e vivo momentos inesquecíveis. Pessoinhas engraçadas ou sensíveis ou sinceras ou intensas ou corajosas ou tudo isso junto. Amo elas porque elas são elas e elas me amam porque eu sou o Clau. E hoje eu tenho um amor! Hoje eu tenho a felicidade de ter chego onde sonhava chegar. Estou onde os meus brinquedos me contaram que eu chegaria. Eu cheguei como todos os amigos esperavam que eu chegasse. Eu cheguei para o meu amor e nunca é tarde. Cheguei e agora quero ficar. Eu sou o Clau e posso te falar, assim de maneira boba, que eu gosto de ser o Clau. Eu tenho dois salsichas lindos, eu tenho uma facilidade que muitos chamam de arte, tenho iogurte de morango sobrando na geladeira e pãezinhos de ovos sempre a me deliciar. Eu tenho duas caixinhas de madeira, tenho as melhores histórias em disquinhos prateados. Tenho fotos diversas e diversas fotos de todos os dias, os melhores dias. Eu vou ter minha casa pra voltar, não importa se vai ser em São Paulo ou no Rio ou em outro lugar porque o meu amor vai estar comigo. Minha filha vai se chamar Eva e meu filho Tobias. Meu sonho será sempre poder sonhar e minha felicidade vai ser fazer minha família feliz. Encontrei o meu amor ou ele me encontrou, tanto faz. Hoje estamos juntos e terei novas histórias pra escrever. Eu sou assim, um apaixonado desde sempre e vai ser assim porque eu sou o Clau. É, eu sou apenas o Clau.

6.10.06

Arrumando malas

Encontraram a solução para o fim dos soluços. Solução para soluços! Eu gosto de soluços. Soluços são engraçados, deixam as pessoas constrangidas de um jeito engraçado. Um soluço e um sorriso sem graça, outro soluço e mais um sorriso sem graça e por ai vai soluçando, rindo e fazendo os outros rirem também. Quando eu abandonei os muros seguros era para caminhar rumo ao lugar que me espera. Hoje tem alguém me esperando. Contando horas como eu. Vou voar pra lá, a metade de mim, metade de outro, na busca da outra metade, completando a metade dele. O amor é brega e é assim, se não amor não seria. Seria qualquer outra coisa menos amor. O mundo que ficou já está muito longe e não consigo mais enxergar os altos muros ao olhar para trás. Para trás ficou. Tenho uma nova história para escrever e sobre ela quero contar. A história do meu amor por muito tempo desencontrado e que agora me levará lá nas pedras do Arpoador pra me contar seus segredos. É um sentimento calmo, sincero e que cresce na proporção da distancia. Não há nada que nos separe. Quando um acredita, é a possibilidade do amor. Quando dois acreditam, é o próprio amor. Hoje eu li que é difícil lutar contra a própria natureza. Estava no nick de um amigo que gosto muito e percebi que eu poucas vezes lutei contra mim e que agora, fazendo as malas, estou fazendo exatamente o que sempre fiz: seguir o meu coração, responder a minha natureza, o meu instinto que me levará a felicidade. E se um dia, os que vêem exageros nessas linhas, as usarem para justificar qualquer coisa, eu vou rir e dizer que valeu a pena mesmo assim, pois nada vai tirar o brilho desses dias.Passei por todas as peneiras e funis que alguém poderia passar. Tomei banho em todas as chuvas que uma pessoa pode tomar. Chorei sempre nas horas em que tive que chorar. Eu selecionei e por vezes fui selecionado. E tenho hoje todas as respostas para os que me preteriram de seus sonhos, para todos aqueles que exilei de mim, era pra chegar até ele. Eu estive me preparando para esse momento. Agora basta arrumar as malas e controlar a ansiedade.

4.10.06

É daqui pra frente!

Paciência. Eu também só preciso de um pouco mais de paciência. Encontrei o meu amor e preciso de serenidade pra viver o momento mais esperado de uma vida. Preciso ver o sol nascer e com ele ao meu lado, ver o novo dia de novas possibilidades. É daqui pra frente, quero insistir nisso. Não procuro culpados, não procuro a minha sentença. A vida faz escolhas e as escolhas nos fazem, não posso lamentar por esse amargo gosto de isolamento. Não sei o que pensar e por isso não quero mais pensar. É por isso que tem que ser daqui pra frente. Voltar para os seios fartos dos que procuram me entender, voltar para os que ouvem e que exercitam a sensibilidade. Meu trator foi estacionado lá fora, não pretendo mais usá-lo. O sonho de meses está no lixo, no triste lixo dos dias que não voltam mais e não há culpados. O conflito faz doer aquela parte mais à direita. Eu agacho e sinto a pontada do medo e não posso mais. Preciso de paz para me dedicar a esse novo momento. Preciso de tranqüilidade pra voltar pra casa. É só o que quero. Fechar a porta e poder sorrir. Sorrir porque ao olhar para tudo o que ainda vou viver, ele estará lá, com as mãos voltadas pra mim. Acabaram os dias de espera. Os dias bons passaram, é passado. Os dias de felicidade infinita estão apenas começando. Anote na caderneta, seremos felizes juntos.
"Algumas coisas passam. Outras também. Importante é o que fica"

1.10.06

Aos Amores Amassados

(...)

Um dia disseram a eles que seus amores os aguardavam no Palácio Amarelo. Então, esse grupo de pessoas, com os corações abertos ao amor, caminharam até o lugar que vossos amores lhe esperavam. O Garoto Comprimido era uma dessas pessoas. Apesar de como o chamavam, Comprimido, por diversas vezes ter sido isso e apenas isso na vida de seus desamores, o garoto jamais desistia de encontrar aquele que não o usaria como uma cápsula doce.
Obcecado por esse desejo de paixão, de dias cúmplices, sorrisos singelos, carinho na mão, ele caminhou por lugares escuros, por lugares claros, por lugares que não eram lugar algum. E apesar da chuva de alfinetes, do vento gelado, das estradas longas, dos buracos todos, ele não desistiu e um dia chegou ao Palácio Amarelo com seus obstinados companheiros de viagem.
Ao entrar nos salões do imponente Palácio, o Garoto Comprimido e os demais notaram que ninguém os esperava. O Palácio Amarelo não passava de salas e salões e corredores frios e vazios, onde não se via e não se sentia qualquer tipo de amor correspondido. Pensaram em voltar, fazer a viagem inversa, mas logo perceberam que não havia volta. A promessa do amor de uma vida os trouxe ali e ali eles deveriam esperá-los.
Olhavam todos os dias para o horizonte, além das fronteiras, para ver se o amor chegava e dia após dia era sim, infinitas esperas dos amores que nunca chegaram. A água acabou, a comida também. Assim como a alegria, os sorrisos e o brilho de seus olhos.
E quando pensaram em abandonar de vez a espera e partir para qualquer lugar que não fosse aquele, as colunas do grande Palácio Amarelo não resistiram a tanta tristeza, e como uma armadilha fatal, o Garoto Comprimido e todos aqueles que atravessaram mares e desertos em busca de seus amores, foram brutalmente soterrados pelas lajes e paredes da amarga morada.
Ouviu-se o som do Palácio ruir por todos os espaços, além da fronteira e logo espalhou-se a noticia sobre um grupo de pessoas que, ao buscar por seus amores, ficaram soterradas em meio aos escombros do que seria um dia o lugar onde a busca terminaria. Todos que ouviam a trágica noticia, sobretudo os que ainda não haviam encontrado o seu amor, temiam que debaixo dos destroços estaria aquele que nasceu para lhe trazer a felicidade do amor tranqüilo.
Porém, a difícil viagem, a dura travessia e a falta de forças para levantar as pedras, fez com que todos desistissem do resgate. Preferiam acreditar, e assim arriscar, que o seu amor lá não estivesse e lamentando o ocorrido, esqueceram os pobres soterrados. Mas havia outro garoto, o Garoto Kamikaze, que também sonhava com o amor tranqüilo. Não querendo passar a vida imaginando que seu amor poderia ou não ter sido soterrado, ele pegou a mochila, colocou seu mundo dentro dela e partiu até as ruínas além de suas fronteiras.
Fazer a viagem não era coisa fácil. Estava cansado de amores findados e mal resolvidos. Não sabia se deveria ainda crer nesse que ele não sabia o nome e o sobrenome ou se devia insistir na procura do tal amor já experimentado, com nome, sobrenome e até endereço, endereço esse fácil, próximo, ao seu lado, mas que havia lhe deixado um sabor amargo. Nas dúvidas todas, o Garoto Kamikaze decidiu seguir o seu coração.
Ao chegar nas ruínas do Palácio ele nada via a não ser um monte de concreto e ferro retorcido. Um amontoado de pedra e poeira esmagando pessoas desesperadas por amor e que agora pediam para viver. Foi quando ele ouviu alguém cantar baixinho e, naquele instante, sentiu o coração disparar. Com uma força que ele não tinha, com uma agilidade nunca vista, o Garoto Kamikaze foi retirando as pedras, uma a uma. E depois de horas ele encontrou o seu amor. Era o Garoto Comprimido que lhe sorria e que reconhecia ali, sem mais lágrimas para chorar, o amor que o havia levado até ali.
- Demorei? – perguntou o Garoto Kamikaze.
- Não. – respondeu sorrindo o Garoto Comprimido – O amor nunca chega tarde, ele sempre chega na hora certa.
E então o Garoto Kamikaze retirou do meio das pedras o seu amor. Com todo o carinho do mundo o levou de volta. O levou para o lugar onde eles construirão a casa deles.

(...)

Ás vezes as pessoas não percebem onde o que elas acreditam as podem levar. Salvam outras, sem notar. Nos devolvem a vida e nem percebem que fazem isso. Nos devolvem a vida em cada gesto de carinho, em beijos singelos e em olhares calmos. Coisas simples, pequenas, mas que podem significar muito para alguém. Mas tem pessoas que não tem a coragem de tirar os seus amores soterrados pelas pedras e assim, as abandonam na crença de que não são os seus amores que sofrem as tragédias que eles evitam crer que não existe. Há milhares de pessoas soterradas aguardando o resgate. Milhares de pedras amassando amores tranqüilos pelo mundo. Eu posso dizer que fui salvo. Eu posso dizer que no momento em que vi a luz e ele estava lá, cansado e sorrindo pra mim, eu tive naquele momento a vida devolvida. E por isso os meus dias serão pra ele.

29.9.06

29 de setembro de 2016

Pra quem acredita na eterna rivalidade entre cães e gatos, brasileiros e argentinos, tucanos e petistas, eles estão ai pra provar que tudo isso é balela. Um paulista. O outro, carioca. Juntos a dez anos, o diretor e roteirista Clau Scissorhands (35) e o ator E-Miller (34) enfrentaram a ponte Rio-São Paulo, a via Dutra e as altas contas de telefone. Tudo começou pelo orkut, avançou por textos em blogs, conversas instantâneas por msn, torpedos de celular e quando viram estavam juntos. Enquanto E-Miller gravava no Rio, Clau recebeu nosso repórter da Tripa em seu apartamento na capital paulista.

Tripa: Vocês sempre ficam longe assim?
Clau: Nem sempre. O E tem muitos trabalhos no Rio e eu aqui em sampa, então a gente mantém um apartamento lá e outro aqui, fica mais fácil assim.

T: Mas onde é a residência oficial? Aqui ou lá?
C: Nem aqui e nem lá. A residência oficial fica em Plutão.

T: E onde fica Plutão?
C: Num lugar só nosso (risos).

T: Como exatamente vocês se conheceram?
C: Eu estava numa fase de viver de amor inventado. Sabe o que é amor inventado?

T: Não (risos) Aquele de quem falava Cazuza?
C: Então, amor inventado não tem nada a ver com tapa na pantera como você pode estar imaginando (risos). Eu queria viver um amor inventado, não necessariamente um amor de verdade, consegue entender? Então inventei que estava com alguém e ficava inventando situações ao lado dessa pessoa. Mandando cartas, dedicando músicas, levando comigo nos encontros com os amigos. Só que chegou uma hora que eu sentia falta que essa pessoa tivesse um nome, um sobrenome, gostos, um rosto...

T: (interrompendo) Falta de alguém de carne e osso?
C: Ainda não. Estava muito vago aquele amor inventado. Era apenas uma moldura, eu queria a tela, sabe? Não queria conhecer alguém, só queria que alguém muito interessante me emprestasse o seu nome, o seu sobrenome, sem saber que estava me emprestando.

T: E como fez pra achar esse tal doador?
C: Comecei numa busca boba em perfis do orkut. Entrei em algumas comunidades que considerava bacanas e me lembro até hoje, foi na comunidade do filme O Casamento de Muriel, eu adorava aquele filme e então pensei: se eu adoro esse filme outra pessoa que gostar também só pode ser muito interessante (risos). Foi assim que encontrei o E.

T: Mas se você não procurava se envolver como diz, como que se conheceram? (repórter impaciente).
Clau: (risos) Calma. Acho que ele viu que eu visitava o perfil dele todos os dias. Porque como ele era o meu namorado, pelo menos na minha cabeça, eu entrava no perfil dele todos os dias. Até que ele leu o meu blog e leu um texto que eu havia escrito pra ele e deixou um comentário, deixei no dele, o adicionei no msn e nunca mais deixamos de nos falar.

T: Que coisa maluca! E ele sabia que o tal texto era pra ele?
C: Não. Só depois que eu contei.

T: E ele?
C: Agradeceu.

T: E você?
C: Fiquei preocupado que ele me achasse um maníaco (risos).

T: É uma linda história.
C: Eu tenho muito orgulho de como nos conhecemos.

T: E a coisa foi rolando pela internet?
C: Sim mas com cautela, até porque estávamos muito conscientes da distância, de que aquela coisa virtual é muito louca, as pessoas dizem o que querem com uma facilidade enorme, então fomos com calma, ele muito mais porque ainda estava gostando de alguém.

T: E você disse que não pretendia conhecer ninguém, estava curando alguma desilusão amorosa também?
C: Não, eu nunca fui de estender as minhas desilusões amorosas. Vivo, choro e pronto. Havia passado por uns momentos não muito agradáveis que nada tinha a ver com amor e estava me sentindo muito só, mesmo assim não queria conhecer ninguém. Achava que nunca mais conheceria alguém especial, então se não fosse pra viver algo especial e verdadeiro, que ficasse só.

T: E como foi quando o viu pela primeira vez?
C: Foi mágico. Eu estava descendo a escada rolante do setor de desembarque do Tietê. E ele estava lá, o E estava lá assustado já que era a sua primeira vez em São Paulo. Acho que devia estar pensando que foi uma pegadinha ou algo assim (risos), que eu não fosse aparecer. Ai quando nos vimos nos abraçamos e foi assim, sem aquela vontade de largar mais.

T: E foi amor a primeira vista?
C: Foi, ou melhor, eu me apaixonei nos minutos seguintes dentro do metrô. Quanto ao E eu não sei, nunca perguntei a ele. Mas eu me lembro que fiquei com a sensação de que ele não tinha gostado de mim, que só fui começar a achar de fato que poderia estar sendo correspondido quando ele já estava voltando pro Rio.

T: E quanto tempo ele ficou aqui?
C: Um final de semana.

T: O que ele conheceu de São Paulo? Ou melhor, o que você quis mostrar pra ele? (risos).
C: Fomos no Vegas, uma balada bacana na Augusta. Andamos na Paulista, Ibirapuera, Benedito Calixto, Espaço Unibanco onde vimos O Tempo que Resta de François Ozon.

T: Bastante coisa para dois dias?
C: É. Mas passou muito rápido.

T: Logo depois vocês fizeram Nevermind, o primeiro de muitos curtas juntos.
C: Sim. Ele voltou pro Rio mas nos víamos sempre. O engraçado que ele não conhecia São Paulo e eu apresentei pra ele e eu nunca tinha ido ao Rio de Janeiro, foi o E que me apresentou a cidade maravilhosa. Mas então, escrevemos Nevermind juntos e contracenamos também, foi uma experiência fascinante. Já estávamos apaixonados e toda aquela paixão ficou explicita ali.

T: Será que é por isso que Nevermind é um dos seus trabalhos mais elogiados?
C: (risos) Se for pelo amor que tenho pelo E, todos os meus trabalhos deveriam ser elogiados (risos).

T: O fato dele ser um ator famoso, assediado pelos fãs, não te incomoda?
C: Eu conheci o E antes disso tudo acontecer. Eu estive ao lado dele em cada peça, cada filme, cada conquista dele. Tenho muito orgulho de ter estado ao lado dele e ver ele realizar os sonhos dele. É como se fossem os meus próprios sonhos. Ver o E feliz é estar feliz.

T: E como foram esses dez anos?
C: Foram os melhores anos da minha vida. Eu sempre brinco que viver não é apenas estar vivo. Viver é viver algo que se acredita e eu sempre acreditei no amor. Sempre existiu dentro de mim uma crença muito forte de que alguém apareceria na minha vida. Tudo passou a ter mais sentido. Ter alguém pra voltar, pra contar como foi o dia, pra rir de coisas bobas, pra brigar pelo canal da TV, pra querer sempre mais, sabe? (emocionado)

T: Sei (risos). Achei que sei. Eu percebi que você se emocionou...
C: (interrompendo) Sim. Eu me emociono porque eu sei que são poucas as pessoas que tem a sorte de encontrar o amor de uma vida e eu tinha essa certeza desde os meus primeiros dias com o E. Parecia até exagero no inicio, coisa de adolescente, milhares de mensagens no celular, planos mirabolantes de ir morar no Rio ou de trazer ele pra cá, mas é porque eu sabia que era ele, eu via nos nossos olhos. (novamente emocionado) E sabe, ele me disse sim quando eu achava que minha vida seria seguidos nãos. Ele me salvou, me deu a mão quando eu não queria a mão de mais ninguém e isso emociona mesmo. Por isso que mesmo dez anos depois eu tenho medo que ele vá embora. E não porque acho que não vou encontrar mais alguém que me queira. Eu vou encontrar quem me queira. Mas eu nunca mais vou encontrar ele e eu sei que passaria meus dias procurando ele em outros naquela coisa de olhar e ver o rosto dele pelas calçadas, dentro dos ônibus, na televisão. Eu amo ele.

T: (repórter emocionado também) Só de ouvir você falar, eu consigo ver esse amor. Ele existe, eu vejo. (pausa) Vocês tem alguma música?
C: Temos muitas mas há uma que nos marcou muito, Último Romance dos Los Hermanos.

T: Por que?
C: Não sei dizer, há um trecho que traduz perfeitamente o que um quer para o outro que diz assim: me diz o que é o sossego que eu te mostro alguém a fim de te acompanhar.

T: E suponho que ele tenha dito o que é o sossego?
C: Sim e por isso estamos juntos. Ambos presenteamos o outro todos os dias com isso. Com segurança, com cumplicidade, com amizade, companheirismo, carinho e amor. Eu sei que é brega mas hoje, aos trinta e cinco anos eu tenho muito orgulho de me chamar de brega. Porque se brega é se apaixonar todos os dias pela mesma pessoa, então eu sou o brega mais feliz do mundo.

T: O que espera dos próximos dez anos?
C: Eu espero poder ler essa entrevista e sorrir com o E do meu lado. Poder olhar no fundo dos seus olhos e dizer: valeu a pena. É o que quero, ter ele ao meu lado, sempre.

27.9.06

Atlantic

Eu me divertia com a caixa de giz de cera e se alguém dissesse que aquilo era uma bobagem eu poderia então desenhá-lo com a cabeça grande, braço curto, perna longa e uma verruga na ponta do nariz. A vida era muito mais fácil, o prazer era sujar as mãos com o tijolo escrevendo meu nome nas calçadas até minha casa. Marcando o território de criança, o espaço infantil que agora mora naquela gavetinha pequenina entre as férias de meio de ano e os domingos de piscina. Já naqueles dias eu te procurava. Havia um mistério que me inquietava a procurá-lo nos brinquedos. Me fazia rabiscá-lo nas folhas e cantos das páginas dos cadernos. Eu procurei você quando nem sabia que você era alguém. Procurei quando nem sabia que você era você. Procurei sem saber que procurava. Sei que são palavras fortes. Sei que hoje qualquer um escreve o que quer, que descreve sentimentos que não existem, que nos emocionam com suas histórias inventadas. Mas eu não poderia mentir pra você porque seria mentir pra mim mesmo. Se me vejo dentro do seu olhar, então não posso mais mentir pra você. Então acredite quando digo que te procurei e que não te achei quando achei que tinha te achado. Foi um longo caminho até aqui. Foram longas procuras desencontradas. Quando penso em algum momento da minha vida penso em você no exato momento. O que estaria fazendo? Chorando quando eu sorria? Gritando enquanto eu me calava? Na calçada de Copacabana e eu no terraço do Copan? Não importa o que você estava fazendo, você não estava comigo. Eu não estou na sua lista de dia dos namorados, não sou motivo dos seus desabafos, não fui o responsável pelo seu primeiro beijo, nem pelo primeiro sorriso cúmplice. Você demorou mas chegou na hora certa. Você apareceu quando eu quase tinha perdido a razão, quando nem sorvete de uva me fazia sorrir. Você surgiu como esse sonho bom quando Plutão nem era mais planeta, quando eu havia desistido das canetas e quando eu nem mais sonhava com o coturno e com a lambreta. Agora tenho você e já não estou mais só. Agora é primavera e não posso dizer que procuro o que já encontrei. Então não importa o tempo que nos separou. Não importa os momentos que perdi não repousando ao seu lado. Há um céu pra cruzar, uma estrada pra gastar e muitas estrelas até Plutão pra contar. Hoje eu durmo mais cedo pra dormir mais e assim poder sonhar mais e mais. E o vendaval, o filme no sofá, o abraço na Paulista, a feira na pracinha, está tudo aqui, te esperando.
Não fui o primeiro... mas posso ser o último.

26.9.06

O dia da devolução ou O dia seguinte

Um dia eu acordei e um monstro com muitos braços, cabelo espetado e olhos para todos os lados me acordou e roubou coisas boas que havia em mim. Nesse dia, esse monstro sem nome, sem urros e sem outros barulhos, entrou por uma fresta, beijou-me a testa e deixou em mim aquela coisa que não se vê, que não se pode tocar e que por muito vai ficar comigo. E ele se foi pra nunca mais voltar. Viver faltando um pedaço requer cuidados especiais. Requer janelas largas, cortininhas coloridas, músicas especiais, geléias de morango e lambida de cachorro. É preciso beber água filtrada, palavras cruzadas, saquinho de risadas, filmes com pipoca, som de chuva e biscoito ou bolacha recheada. Viver faltando um pedaço é viver sem pensar no pedaço que falta e se pensar não se desesperar achando que ele está na lixeira da próxima esquina. É não ligar para as lamentações alheias, para os que só falam de trabalho ou dos descasos da vida, quando você vê os pedaços que faltam em você ali, completos neles. E quando você acredita que a vida vai ser assim, viver fingindo que não falta pedaço algum, surge alguém de longe, e sem saber (ou sabendo) lhe devolve as coisas boas que o monstro roubou. E devo dizer que ver o pedaço que faltava, abrir a caixinha azul e verde e ver lá dentro a luz antes perdida é o momento em que se pode dar conta de que viver é mais do que viver, seja completo ou faltando pedaço. Viver é ter a sensação de estar completo, apesar de todos os buraquinhos e nós. É se reconhecer no outro. É saber que pode sonhar porque a busca acabou e novas histórias serão escritas em lugares onde o monstro e seus braços não conseguem chegar.

25.9.06

A caminho de Plutão

Fiquei ali, do outro lado do vidro, segurando um choro que sairia gritado. Fiquei lá, braços cruzados de frio. Braços cruzados, imobilizados com a cena que acontecia na plataforma 29. A lágrima acumulou naquela bordinha baixa do olho, aquela mesma que em você é vermelhinha de alergia. Eu conseguia enxergar minha própria lágrima ali, se segurando toda pra não partir com você. E quando vi você sentar na poltrona 15 percebi que era a minha hora de voltar pra casa. Ainda pude te ver um último instante, como a última vez de uma última vida. Fiquei perdido na rodoviária uns dez minutos. Nem sei se procurava a saída. Fui caminhando em círculos, em meio às pessoas que iam e que chegavam. Me sentindo perdido, tentando entender daquele momento de minutos atrás, tentando entender o final de semana e as loucuras todas que haviam me levado até ali, ao saguão imenso do Tietê. E quando me dei conta que meu coração batia e que você estava lá, sorrindo pra mim, achei em fim o caminho e deixei o túnel da cidade me engolir e me misturar no mundo que você conheceu.

(...)

Cheguei em casa e o seu cheiro está aqui. Nos travesseiros. No lençol. Nas paredes. Há você aqui em todos os cantos. Nas músicas que levou, no roteiro, em mim. E então não consegui fazer outra coisa a não ser escrever. Dizer que é bom acreditar que vou morar em Plutão com você e que vamos plantar melancias e receber os bons amigos e que vamos dançar e que vamos acreditar cada vez mais. Meu olhar é por você. Os gestos, as idas aos médicos, os roteiros absurdos e os cansativos também. Os dias de trabalho, a natação, a sinceridade que pode doer em outros, tudo por nós. O tempo que nos resta é muito tempo. E a distância que nos separa, muito curta. São 18 milhões de pessoas e eu estou no meio delas e quem consegue me alcançar é você que está do outro lado da fronteira. Acreditei sempre e continuarei assim. Não quero um outro olhar, um outro sorriso, outro sotaque que não seja o seu. Não quero outro sonho que não os que poderei dividir com você. Não quero inventar palavras que não sejam lidas e relidas pela sua atenção silenciosa. Não quero e não vou tropeçar em outro pelas calçadas paulistas. Não vou mais me perder, portanto, sempre terás como me encontrar. Hoje eu li que o Brasil é uma República Federativa repleta de árvores e de pessoas dizendo adeus.

(...)

Mais tarde tenho a consulta. A realidade dói demais em alguns dias. A dor não física mas que sobe margeando a espinha, me cobre de medo, e sobretudo agora que tenho planos e casa pra construir. Mas são coisas que não devo fugir. Medo que tenho que tolerar. O desejo, mais do que antes, é que me seja dado o tempo para que eu possa te ver mais e mais e mais outras muitas vezes. Seja no abraço do Cristo, na garoa da Paulista ou no vazio de Plutão. Então, toda noticia boa hoje é mais que uma boa noticia. Tornou uma milha acumulada pra passagem que me levará até você em Plutão. Posso continuar acreditando? Posso focar em tudo o que lhe disse? Posso deixar de viver de mesmices? Posso crer que nos veremos novamente?

21.9.06

Um sorriso e um mundo inteiro!

Estou em algum lugar entre o sim e o não. Na mão aberta e escancarada do tesão. Vento na cara, a cara no mundo, o mundo no bolso e o bolso sempre vazio. E decisão decidida, as boas vindas, os novos dias de novos sabores e de reflexo admirável. Sou a exceção no seu mundo de não. Sou o feliz que pode sempre lhe sorrir e dizer sim. A vida é assim, de esperas esperadas em noites turbulentas onde lágrimas enchem piscinas onde outros se divertem. Nada mais assusta corações acostumados com os trens fantasmas. Nada mais pode assombrar com perguntas e rejeições que vem em caixinhas ecologicamente corretas. Tudo tão pronto e tão igual que o desejo é ser com uma vírgula a mais. Com um defeito exagerado e outro calmo. Palavras tortas e frase manca, eu ainda estou ali – com a alma aberta e louca esperando o que logo, muito em breve, quase agora, vai surgir e fazer rebuliço no mundo já muito bem rebuliçado e remexido do senhor da bagunça mal arrumada. Os dias vão ser assim: coisas que vem e que depois vão e que depois vem de novo pra um dia ir e pra no outro ficar de vez. Então me mostre a sua mão e eu posso te contar aquele segredo que ninguém sabe. Mostre que não estamos mais sozinhos e eu abro a janela quando amanhecer. E dessa loucura de ir e esperar, e nessa coisa doce e doida de acreditar nas melancias, o dia é mais que um simples dia. É magia vivida. É o que acontece quando se acredita...

18.9.06

Máquina de girar pessoas

Ando pensando muito sobre a espera. Conjuguei o verbo esperar em todos os tempos em todos os pretéritos, no passado, no futuro. Eu esperei. Eu espero. Te esperarei. Como eu poderia crer na beleza de suas letras? Como imaginar encontrar a felicidade na espera? Parece fim de filme mal acabado mas há uma beleza escondida nesse espaço entre o sentar, deixar o mundo girar e aquele momento que sentam ao seu lado e você pode estar ali, sorrindo, cansado e ainda assim sorrindo. Não me tirem isso. Não tirem a beleza dos dias calmos. Eu girava com o mundo e agora ele gira sem mim. Saí da roda. Preferi assim. E se você está ai dentro olhe aqui pra fora, posso acenar pra você! Posso sorrir pra você! Mas não posso entrar mais na roda que gira e que gira. Nos perderíamos dentro dela. Giraríamos entre círculos, você lá em cima e eu lá embaixo. Um “timing” desconexo, desajustado e apesar de querer a mesma coisa, a paz do amor tranqüilo, dos suspiros verdadeiros, estaríamos muito perto e muito longe. Ai dentro, dessa roda, eu seria mais um. Um qualquer. Aqui fora eu posso ser eu. Posso jogar milho para as pombas, cantar canção de ninar para o Pipinho, me fartar de olhares calmos e dias repetidos porém seguros. Posso te ver ai dentro girando e vivendo e se perdendo em tudo aquilo que tens que viver. Nessa máquina de lavar coisas, nesse giro doido, até que essa roda estúpida te vomite pra fora como me vomitou um dia e eu possa te pegar e dizer: “porque demorou?”. Mas enquanto isso não acontece eu fico aqui, ouvindo canções, me divertindo com aquele garotinho que mais parece um bonequinho de tão engraçado. E assim os dias lentos passam mais rápidos e posso senti-lo perto. Então rode, rode, um dia ela para.